Inquérito SP_EF_157

SPEAKER 2: : como sabem, é o teatro na década de trinta. N ós po uu poderia ou fazer um panorama geral, naturalmente um pouco superficial, porque há muita matéria para um tempo bastante escasso, ou poderia, ao contrário, aprofundar apenas um pon referente a este período. Eu preferi, entre essas duas duas alternativas, eu preferi a primeira porque me parece que o que este curso visa é, sobretudo, dar um panorama geral da cultura e do pensamento brasileiro. De maneira que eh importa mais esta vista de olhos que realmente vamos fazer hoje sobre o teatro, do que o aprofundamento que não caberia num curso tão rápido como este. Eu queria também fazer algumas observações preliminares no meu lugar, quanto talvez alguns ãh preconceitos meus em relação a esse período. falar sobre o teatro em trinta, tenho uma vantagem e uma desvantagem. vantagem é que eu assisti esse teatro lizmente, isto é (risos), eu já tinha idade naquela época para ir ao teatro, de maneira que eu vi a maioria dessas peças das quais vou falar, conheci esses autores, se não pessoalmente, pelo menos vi as suas peças, conheci também esses atores. A desvantagem é que eu ãh participei também da vida teatral mas não na década de trinta Eu participei éh como diretor de grupos amadores, como crítico posteriormente, mas eu participei principalmente a partir da década de quarenta. posso dizer que o trabalho da minha geração foi exatamente contra a geração anterior, como sempre acontece (risos). Os filhos sempre são contra os pais. De maneira que, ah na verdade, esse teatro que eu vou focalizar hoje foi um pouco o teatro que a minha geração combateu e E é possível então que eu tenha, mesmo sem perceber, algum preconceito contra ele Nesse sentido, eu fico muito satisfeito de que O Raimundo Magalhães Júnior, que aliás é um pouco mais velho do que eu, já (risos) já tenha falado aqui sobre o mesmo tema, porque isso me põe bem mais à vontade, e vocês poderão então cotejar um pouco os dois panoramas do que ele forneceu, que eu sei que foi muito bom e que eu vou tentar dar agora. É claro que muitos pontos serão repisados, deverá haver muitas repetições, talvez também algumas coisas em contradição, em contradição entre o que ele disse e o que eu vou dizer. Mas eu creio que isso também não é um mal, porque se nós o repetirmos isto prova que provavelmente é verdade Se ao contrário, se nós nos contradizermos, isso prova que se trata de interpretação pessoal, quer da parte dele, quer também da minha parte, e vocês terão nesse caso uma possibilidade pessoal de escolha. Antes de falar propriamente sobre o teatro de trinta, eu quero dar também, muito rapidamente, uma ideia do que era o teatro em mil novecentos e vinte, na década de vinte, na década anterior, para ãh dar um pouco uma ideia de qual foi a herança que o teatro de trinta recebeu e em que ponto ele inovou, em que ponto ele se afastou do teatro que até então se fazia. O teatro da década de vinte consiste sobretudo na chamada comédia de costumes que havia se formado por volta de mil novecentos e vinte, isto é, entre Uma comédia ãh de costumes que, aliás, foi, em parte, suscitada pela Primeira Grande Guerra, porque como as relações entre o Brasil e a Europa se tornaram mais difíceis, as companhias portuguesas deixaram de vir ao Brasil, as companhias francesas também começaram a vir com menor frequência, isso propiciou economicamente o aparecimento ou o reaparecimento, o ressurgimento do Teatro Nacional, que vai ãh se formar à volta de atores como Leopoldo Fróis, que vai ser o grande ator da década de vinte, com o Procopio Ferreira, que vivo ainda hoje, que naquela ocasião era muito jovem, estava começando a carreira, com a Paulana Pinto, que vinha já do século passado, mas que ainda fez muito sucesso, de Abigail Maia e outros ãh de menor vul Se formou também esse teatro a volta de autores como Gastão Togero, Viriado Correia, Armando Gonzaga ou Duvaldo Viana. Isto é, todo um núcleo de autores que tratavam sobretudo ãh de dois temas É claro que estamos aqui esquematizando e simplificando O primeiro seria a superioridade do Brasil sobre o resto do mundo. Superioridade, é claro, não em termos econômicos, como nós estamos acostumados a pensar hoje em dia, mas em termos sentimentais. O Brasil poderia ser menos desenvolvido que os outros países, mas, em compensação, o nosso coração seria maior, as nossas mulheres amariam com maior pureza e assim por diante. Então, é frequente a figura do rapaz brasileiro que vai para o estrangeiro, que volta cheio de manias do estrangeiro, volta estrangeirado, depois ao contato com o Brasil autêntico, pouco a pouco ele vai readquirindo os seus valores tradicionais brasileiros. Também, muito comum, era o tema da superioridade do campo sobre a cidade no Brasil. Esse tema é quase que a pontuação do outro. Por que que o campo era superior à cidade? Porque no campo nós encontraríamos um Brasil mais autêntico, um Brasil menos cosmopolita, um Brasil menos deformado por influências estrangeiras. Então, realmente Ou se não no () primeiro no subúrbio do Rio de Janeiro, que era uma espécie assim de passagem para as grandes cidades e o campo Aí nós encontraríamos verdadeiramente a famosa simplicidade da vida brasileira, o nosso provincialismo, que seria uma alta qualidade contra a sofisticação estrangeira. Essas peças, em geral, passavam-se em um ambiente de uma família, que era mostrada na sua quase totalidade. Por exemplo, marido e mulher, briga de marido e mulher. Frequentemente o marido era, por exemplo, vamos supor, farrista. Voltava trade para a casa, às duas, três horas da manhã. É claro, a mulher ficava furiosa, mas acabava perdoando, porque o ma o marido era muito simpático, muito engraçado. Havia a sogra, que discutia com o genro, também dava ocasião para algumas cenas cômicas. Havia a velha avó, que vinha do passado, por isso era muito autêntica, muito brasileira. Quando a neta, que eu às vezes a peça mostrava três gerações, quando a neta, que tinha dezesseis, dezessete anos, tinha sua primeira desilusão de amor. amor não correspondido, o amor que ela não confessava a ninguém. Então, ela ia se desabafar com quem? Com a velha avó A avó sentava na poltrona, a neta se ajoelhava no chão, punha a cabeça no colo no colo da avó e a avó dizia conta, minha filha conta para a sua avó, e ela contava, claro éh hum Então, havia a cena, a Polona Pinta especialista nisso, papel da avó, compreensiva, bondosa, e havia a ingênua, que contava as suas penas de amor, Havia os amigos da família, que, ah como as peças passavam muita frequência no Rio de Janeiro eh, os amigos eram funcionários públicos, personalidades, assim, engraçadas, cômicas. Havia o casal de empregados, o chofer, a empregadinha, que ainda era o resquício da dos papéis de empregados, talvez, da comédia do século dezoito, do século dezenove, porque eles faziam uma espécie, assim, de dueto cômico Ao lado da peça, geral, o chofer namorava a empregadinha. Então, como havia, no nível dos patrões, havia os casos amorosos sérios, no nível dos empregados, havia o amor também, mas, já aí, em um plano puramente de comicidade. É esse, mais ou menos, o teatro de costumes e E é esse o teatro que, a década de trinta, vai procurar renovar. Antes de falar provavelmente sobre os autores e sobre as peças, convém dizer alguma coisa a respeito do funcionamento desse teatro na década de trinta. Eu sei, pelos resumos que eu vi no jornal, que o Raimundo Magalhães Júnior também falou a esse respeito, mas, em suma, eu não sei exatamente o que ele disse, então vou fazer como se ele tivesse dito nada (tosse) ãh O teatro funcionava por sessões, Isto é, de uma sessão às oito horas, de outra sessão às dez horas. Isso para o teatro poder entrar em concorrência com o cinema. O cinema era por sessões, então o teatro também passou a ser por sessões. Houve até um momento que o Leopoldo Frois fez uma experiência de fazer teatro exatamente como cinema, isto é, duas, quatro, seis, oito, dez. Mas (risos), evidentemente, isso não podia funcionar porque nem havia público. E também nem os atores aguentavam, representar das duas à meia-noite não era possível. Então éh, realmente, isso não foi por diante. Mas ficou pelo menos o hábito de duas sessões por noite. Isso significava que os espetáculos eram muito curtos. Porque se a peça durava das oito às dez, e se nesse intervalo, ah geralmente nós tínhamos dois intervalos para descanso, porque as peças em geral eram de três atos, Na realidade, as peças tinham uma duração no máximo de uma hora e vinte, uma hora e meia, não mais do que isso. Uma duração muito menor do que as peças, por exemplo, do século passado. No século passado, uma peça durava éh, fora o intervalo, durava três horas. Com os intervalos, durava quatro horas. Porque quem ia ao teatro no século passado, como havia muito pouca diversão, quem pagava o teatro queria ver bastante diversão. Então ele entrava às oito e saía à meia-noite, uma hora da manhã. Ele via uma peça enorme e, além disso, mais uma comédia, et cétera. Agora não. Ao contrário, já se procura um ritmo mais rápido, quase como se fosse mesmo um cinema, coisa mais ãh breve. Isso fazia com que as peças maiores fossem muito cortadas para poder caber dentro desses moldes. E havia também, eu sei que o Ramon Magalhães tocou nesse ponto, as estreias eram quase que ãh semanais. Algumas festas, é claro, duravam mais tempo, as festas de grande sucesso duravam dois, três meses em cartaz, mas o normal ah é que a festa durasse apenas uma semana, dez dias, não mais do que isso. Então, eu me lembro muito bem, no começo da década de trinta, assistia a Companhia do Procópio, que era a companhia cômica melhor do momento, ele fazia estreia toda sexta-feira. E nós... éh é difícil su éh supor, hoje em dia, como é que se pode preparar uma peça numa semana. Mas eles preparavam e isso explicavam também pelas características do espetáculo. primeiro lugar, pela sonografia, que era muito mais simples do que é hoje em dia. Hoje em dia nós temos um cenógrafo, que é um artista que faz o desenho, que é executado com todas as suas minucias, só serve praticamente para aquela peça. Na época, não. Havia o chamado cenotécnico, que era um misto de cenógrafo e de maquinista do teatro. Isto é, ao mesmo tempo, ele desenhava ou ele imaginava o cenário, e ele mesmo que era o executante, ele mesmo que dirigia os maquinistas. Em geral, a companhia, éh para poder funcionar, precisava basicamente ter dois cenários. Um que era o cenário fechado, como eles chamavam, era o gabinete, que era uma sala, E outro é chamado de cena aberta, isto é, quando a cena se passasse num jardim, en enfim, fora de casa. Com esses dois cenários, eles mais ou menos podiam representar todas as peças, porque toda peça ou passa dentro de casa ou fora de casa, não há uma outra possibilidade. Então, com esses dois cenários, não digo que ficasse uma representação perfeita, mas pelo menos se quebrava o galho. Também ah os móveis e todos e tudo que se coloca em cena, os chamados adereços, os quadros. Tudo isso era fácil porque tudo isso vinha da casa teatral. Havia o contra-regra que ia na casa teatral, que é uma casa que existe até hoje, onde tem todo esse material de teatro. O contra-regra ia lá, escolhia e fazia com que o gabinete parecesse um pouquinho diferente, embora eh sempre mais ou menos se repetindo. Eu me lembro, como eu ia bastante ao teatro des dessa época, eu me lembro que havia divãs, que eu conhecia de muitas e muitas peças, (risos) quadros também, e assim, por exemplo, estantes de livros. Quando era um intelectual, ou era um professor, sempre no fundo tinha um estante de livro. Que, aliás, não era nem composta de livro, porque os livros eram pintados, apenas as lombadas, assim. Então, a estante era sempre a mesma éh Era mais, assim, um signo, vamos dizer para o público né Olha, É um intelectual, tanto que ele tem livros éh Mas não era necessário uma dose maior de realidade do que essa. Então, se poderia montar o espetáculo materialmente, realmente, de um dia para o outro. E é assim que as companhias faziam. Também, em relação aos atores, acontecia quase que a mesma coisa, porque cada ator tinha aquilo que o francês chama de un emploi. e que nós podemos traduzir, não da maneira perfeita, por gênero. Cada ator estava classificado num gênero. E uma companhia bem feita tinha os diversos gêneros de atores para todas as possibilidades de personagens. Num livro publicado exatamente em mil novecentos e vinte e nove, quer dizer, um livro bem da época, um livro titulado O Livro do Ator de Celestino Silva, ele esse livro enumera Todos os gêneros de atores e atrizes comuns, ainda em mil novecentos e trinta, mas numa classificação que já vinha do século passado. Por exemplo, os atores. Haviam vários tipos Em primeiro lugar, havia o galã. O galã subdividido. Podia ser galã cômico, galã dramático. Porque um era especialista num gênero, e o outro era especialista em outro. Havia uma outra ainda outras ainda subdivisões. Galã brilhante. Galã brilhante é o galã engraçado, espirituoso, mas não é cômico propriamente. Havia o galã amoroso. Esse é o galã propriamente dito éh. O galã jovem, como eles chamavam éh. A função dele era apenas amar e ser amado, nada mais do que isso. Havia o galã cínico e. Esse, ao contrário, era um galã assim que poderia exercer um certo fascínio, mas dando sempre a impressão de que as mulheres não podiam confiar muito nele. Exatamente aí que estava o encanto dele. Depois havia o centro cômico, que era o cômico principal, havia o centro dramático, não era muito necessário porque se representava muito poucos dramas nesse período. Havia o baixo cômico, o bufi, ou caricato, e havia os atores característicos. Isto é, os atores que sabiam se maquiar muito bem e cada vez surgiam em cena com oportunidade diferente das vezes anteriores e que faziam papéis secundários, papéis cômicos, mas que tinham que contribuir para dar a comicidade ao espetáculo. Realmente, o que era importante desses papeis todos era o galã, o cômico e os característicos. Em relação às havia a chamada dama brilhante, a dama galã e a dama coquete. Havia a subreti, que era papel de empregadinha, mas empregadinha viva, engraçada, bonita. Havia a ingênua, que podia ser ingênua cômica ou ingênua dramática também. havia a dama central, que era a pessoa mais velha, a avó, por exemplo, havia a caricata e havia as características. Em suma, a companhia tendo um ator em cada um desses gêneros, ele podia fazer com facilidade qualquer papel, porque as comédias também já eram escritas tendo em visto éh tendo em vista que é uma tipologia própria do teatro do século dezenove e que ainda continuava no teatro do século ãh do. nosso século. Por outro lado, o texto não precisava ser decorado inteiramente, porque havia o ponto. E o ponto éh tinha uma importância muito grande no teatro da época. O ponto era um dos esteios do espetáculo O ponto é que garantia que o espetáculo realmente iria sair, porque como se ensaiava uma semana apenas, os atores em geral sabiam muito pouco o papel. Então, somente no dia da estreia, mas mesmo nos dias seguintes, o ponto que estava ali é ele que dizia praticamente a peça de princípio a fim e que eh se ele não estivesse lá o espetáculo não sairia de forma alguma. Eu quero, como também aqui, dar testemunha da época, para não parecer que eu estou exagerando, eu vou citar um trecho tirado do livro do Luiz Iglesias, o livro chama-se O Teatro da Minha Vida. O livro foi editado em mil novecentos e quarenta e seis, mas se refere sobretudo à década de vinte a trin inta. E o Iglesias, que era um dos empresários, autores mais conhecidos do momento, ele fala sobre o ponto o seguinte, A função do ponto é ler em voz baixa toda a peça para que os artistas repitam em voz alta a parte correspondente ao papel de cada um. Função cheia de responsabilidades, principalmente as primeiras representações de uma peça, quando os artistas ainda não estão seguros dos seus papéis. Após cinco dias de espetáculo, a função do ponto passa a ser de simples acompanhante, soprando as primeiras palavras, socorrendo os artistas dos seus lapsos de memória, Lembrando os movimentos da marcação. () O Ponto, inclusive, dizia para o autor, vá para lá, vá para cá. Quer dizer, ele estava dando também ali a marcação. No Brasil, entretanto, na maioria das vezes, o Ponto tem de pontear a peça de princípio ao fim. Durante todo o tempo que se mantiver em cena. Visto que uma grande parte dos nossos artistas, principalmente a maioria das nossas primeiras figuras, nunca chega a saber seguramente seus papéis. exatamente isso que acontecia. Atores como, por exemplo, Procópio Ferreira, eh como Jaime Costa. Quando o teatro moderno eliminou o ponto, e eliminou o ponto para exatamente obrigar o ator a saber o seu papel em termos de cor, que para a gente parece uma coisa, assim, éh indispensável para que o espetáculo saia perfeito, mas quando, enfim, o ponto foi retirado, o por exemplo, o Jaime Costa teve dificuldade muito grande para se adaptar, porque realmente não se podia exigir um homem já na idade dele, mais velho, que, repentinamente, estava acostumado a representar durante quarenta anos com o ponto, passasse a representar sem o ponto. E, segundo se comenta, uns meses atrás, não sei se é verdade ou não, ele fez algumas peças com um ponto especial, elétrico, alguma um que ele colocava no ouvido, e alguém ficava dizendo a peça para ele. E então, assim, ele poderia representar, porque era a única maneira. Eu me lembro de um episódio que me foi contado por um um encenador italiano, o Gérard Jacobi, de uma atriz, Alma Flora, que aliás era uma atriz boa e uma atriz, assim, muito conscienciosa, e uh o Gérard Jacobi notou, que durante os ensaios, que a Alma Flora sabia perfeitamente bem o papel, mas não dispensava o ponto. E ele então perguntou a e para ela, mas, afinal de contas, se você decorou o papel, por que que eu não posso tirar o ponto? Ela disse o seguinte, ah, é uma questão já quase de reflexo descondicionado. Há trinta anos que eu faço teatro, sempre eu sei o meu papel de cor. Mas eu estou acostumado a ouvir aquele barulhinho que fica ali, falando zim zim zim zim... ali na frente. Se eu entro em palco e não existe aquele barulhinho, (risos) eu entro em pânico e esqueço o papel. E é uma coisa muito compreensiva, eu tinha medo. Eu me lembro também de um... de um velho ator característico, Modesto de Souza, que foi convidado para representar o têbêcê, que naquele tempo era o maior teatro aqui de São Paulo e do Brasil, e que se negou Porque éh, dizia ele o seguinte, trabalhar sem ponto demonstra uma falta de responsabilidade profissional. Para nós jovens era exatamente o contrário. Mas para ele, eu compreendo muito bem o ponto de vista dele. Ele achava que o ator assim estaria à mercê de lapsos, de memória, e que o espetáculo poderia não funcionar, que realmente, para ser profissional, tinha de ter ponto. O espetáculo era dirigido, não por um, um diretor, um encenador, como nós concebemos hoje, alguém que imagina o espetáculo em todos os seus detalhes, materiais, faz uma análise minuciosa de cada papel para cada ator. Mas o espetáculo era dirigido por um um ensaiador, que não tinha uma importância grande na companhia, ao contrário. Em geral, os anúncios nem anunciavam quem era o ensaiador. O ensaiador era um funcionário que estava um pouco acima do Contrarregra ou do Ponto. Era alguém que tinha experiência de teatro, que conhecia, que poderia, como ele se dizia, marcar uma peça, isto é, dar a movimentação dos atores no palco, mas cuja função se limitava a isto. Porque, realmente, éh quem éh criaria a peça deveriam ser os atores, com a sua experiência. O o ensaiador estava ali apenas para evitar confusões em cena. Então o palco era dividido, direito, esquerdo. A parte baixa, que era a parte ju perto ao público, a parte alta. E o ensaiador dizia, vá a direita abaixa, vá a esquerda alta. Dava indicações sumárias desse tipo éh. Havia também uma numeração. O ator que estava mais à esquerda ou à direita, enfim, não me lembro, mas enfim, o ator que estava numa das pontas era o ator considerado número um, o seguinte era o número dois, o terceiro era o número três, o outro era o número quatro. Então o ensaiador dizia o seguinte, passe da posição um para a posição três. ês. O ator passava e E com isto se fazia uma movimentação no palco, mas que era uma movimentação, frequentemente, apenas para que o ator mudasse de lugar. Quando o ator, estavam dois atores um, por exemplo um é lá  o outro aqui. Depois de cinco minutos, o encenador dizia, mude o lugar. Então conversamos, mudávamos de lugar, para apenas, para variar, para descansar um pouco visualmente para o público, mas sem que houvesse uma motivação psicológica procurada no texto para este movimento. Então a movimentação era uma movimentação variada, mais ou menos constante, mas sempre, assim, bastante artificial, isto é, não baseada numa análise do texto, porque nem haveria tempo de fazer essa análise do texto. Todos, tanto o ensaiador como os atores, eram profissionais de muita tarimba, de muita experiência, então eles entravam no palco e lá eles se defendiam, como podiam, e às vezes até brilhantemente. O Leopoldo Frois, ouvi casos de uma peça que ele fez aqui em São Paulo, que fez um sucesso extraordinário, depois éh pensaram em reprisar a peça, uns quinze dias depois, falaram com ele e disseram, posso reprisar, por quê? porque aquele dia eu improvisei, eu inventei tudo, agora eu não me lembro mais do que que eu inventei (riso). (risos) Quer dizer, então aquele espetáculo sido um espetáculo eh praticamente único, era difícil repetir. Eu conversando há dias com o Alfredo Mesquita, que teve uma peça representada pelo Procópio, exatamente nessa década de trinta, ele contou que como é que a peça dele foi ensaiada. Foi ensaiada durante uma semana, exatamente. E ele assistiu os ensaios. Havia o Restier Júnior, que era um ator da companhia, que fazia a marcação. Dizia, passa para cá, passa para lá, vai para o fundo, vem para a frente e tal. E notou que havia sempre um ponto eh eh que não era ocupado por ninguém, que era o centro do palco. Nos primeiros ensaio Pô, então, mas ali não fica ninguém? Ele disse, não, é o seguinte, é que nós vamos ensaiar sem o Procópio, que era o chefe da companhia. E esse lugar que está no meio eh é reservado para o Procópio (risos), porque ele fica sempre no meio do palco, porque ele era o ator mais importante naturalmente. Então eles ensaiaram assim, quando eh já estava quase praticamente pronto, veio o Procópio, que tinha decorado a peça sozinho, ele eh se ah se entrosou e o espetáculo saiu, diz ele, o primeiro espetáculo foi praticamente um ensaio geral. Mas o público não percebia, porque os atores eram atores, assim, com muita experiências ( ) teatro. Eu acredito que hoje em dia isso não seria possível. Mas como eles faziam o ( ) teatro desta maneira, eles tinham os recursos próprios, inclusive recursos de improvisação, para poder na hora resolver qualquer eh problema que surgisse. Esse tipo de teatro, eh na realidade, vem do século dezenove ainda, todo esse tipo de organização. Porque no no século dezenove, a não ser as grandes cidade como, por exemplo, Paris, Mas no Brasil ou na Itália, por exemplo, as peças em geral não ficavam muito tempo em cartaz. Ao contrário, ficavam muito pouco tempo em cartaz. Então as companhias ah tinham um repertório grande de dez ou doze peças ensaiadas. E las eram companhias itinerantes que viajavam, se apresentavam numa cidade. Cada noite apresentavam uma peça diferente. ou, às vezes, hum com muito sucesso, uma peça repetir duas ou três noites, não mais do que isso, que não haveria público para mais. Então, como não era possível, é claro, o ator saber a peça ( ) de cor, dez ou doze peças, esse esse todo es esse mecanismo era baseado nesta improvisação a que as companhias sempre se viam sujei gora, (pigarro) deixando de lado essa organização teatral, ah também quero dar uma ideia rápida sobre o panorama político da década de trinta, embora eu creio que todo mundo saiba isto. Mas aqui, por uma questão de, vamos dizer, de método, de professor, vamos fazer de conta que ninguém sabe, apenas para que todos os elementos estejam presentes. S abe que a década de 30 entra ou se inicia com uma violenta crise econômi a crise do capitalismo, uma crise não só no Brasil, mas nos Estados Unidos, no Wall Street, isto é, no centro do capitalismo mundial, e no Brasil também se inicia com uma revolução, que é a Revolução de trinta, isto é, com a queda de um governo que, afinal de contas, já vinha desde o início da formação da República, um um governo que já tinha quarenta anos de vida, assim, ah de vida regular. Portanto, um período, assim, de uma agitação muito violenta e. nesses primeiros anos da década de trinta, houve, no mundo inteiro e no Brasil também, uma nítida si inclinação para a esquerda. Tinha essa impressão de que o capitalismo estava falido, realmente tinha estava em crise, que, ao contrário, que o comunismo era uma força muito jovem ainda, em plena ascensão, que o mundo talvez viesse a se tornar comunista todo ele num espaço de tempo muito breve. E nós encontramos eh um eco dessas preocupações na obra dos dois maiores escritores de teatro dessa década, que são Juracy Camargo e Oduvaldo Vianna. Ambos foram Naquele momento, ambos foram homens de esquerda e as suas peças estão marcadas por essa ideologia. Esta este movimento, vamos dizer, pendular para a esquerda vai até mil novecentos e trinta e cinco, onde há um levante eh comunista reprimido, aí começa então uma inclinação para a direita que vai durar até o fim da década. ete há a instituição do Estado Novo, há uma repressão do pensamento livre, a censura teatral vai se tornar mais forte. Quer dizer, este, de um modo geral, pelo menos para mim, me parece ser esta o ritmo geral do pensamento nesta década. O teatro reagiu também a esses acontecimentos políticos e econômicos, como não poderia deixar de de reagir. O que nós notamos, então, durante toda a década de trinta, me parece, é um esforço muito grande para se reno para que o teatro né que se renovasse, um esforço muito grande para fugir aos moldes da década de vinte, para fugir à comédia de costumes, mas sem conseguir atingir inteiramente o alvo. Então nós vamos ver várias dessas tentativas de renovação. Primeiro lugar, uma tentativa de renovação quanto ao tema com a introdução, pela primeira vez, ah no teatro brasileiro, pelo menos modernamente, com a introdução da preocupação por problemas econômicos, por problemas políticos e problemas sociais. A peça mais marcante desse momento, como sabem, é Deus lhe pague, de Joracy Camargo, representado por Procópio Ferreira, que vai ser o ator cômico mais famoso da década de tr Era uma comédia, mas já era uma comédia que pretendia ir um pouco além da comédia de costumes, ou pretendia ir muito além da comédia de costumes. Era uma comédia que se que, pelo menos, se não era, pelo menos desejava ser uma comédia de fundo filosófico, uma comédia que seria uma reflexão sobre o mundo moderno tal como se apresentava naquele momento. Uma grande parte da conversa da peça, aliás, é uma conversa entre um mendigo, papel desempenhado pelo Procópio Ferreira, e um outro mendigo chamado Barata. Essa conversa é quase como se fosse, assim, uma conferência a duas vozes. O Barata, a função dele na peça é exclusivamente perguntar para o outro. E Então, como é isto? E o mendigo, que é o Procópio, explica. I sto é assim. Mas por que que isso acontece? O mendigo explica, isto é ele é apenas um, vamos dizer, um interlocutor ideal que dá a réplica. Na verdade toda essa parte quase que é um monólogo do Procópio e esse monólogo é um monólogo a respeito do momento político e do momento social. Inclusive o mendigo uma hora ele cita dois autores que ele te que leria na sua biblioteca. Um desses autores é Karl Marx, e outro é Upton Sinclair, que era um romancista americano de esquerda. Portanto, pela própria leituras, fica bem marcada esta tonalidade esquerdista da peça. E podemos dizer que o que a peça nos dá é uma espécie assim de visão rósea do comunismo. Isto é, o comunismo virá, o comunismo é inevitá Mas também ninguém precisa ter medo, porque eh vai ser um comunismo sem dor, vai ser um comunismo, assim, eh sossegado, feito apenas pela inteligência, através da conversa das pessoas, ( ) um c um comunismo que não vai ameaçar ninguém, não vai matar ninguém. Diz ele na conversa. Nós estamos aqui eh lutando apenas porque precisamos abolir uma palavra do dicionários. Essa palavra é propriedade. ( ), nós sabemos que para abolir essa palavra de propriedade não é assim tão fácil como dizia o Joracy Camargo em mil novecentos e trinta e dois. E, ah ele no outro trecho, ele apresenta o o diz ele representa o comunismo como se fosse uma espécie de bicho-papão das crianças. Diz ele, o mendigo. Eu, quando era criança, tinha um bicho-papão. Tinha um medo horroroso dele. Mas um dia, sem querer, eu sentei em cima do bicho-papão. Quando eu vi, eu estava sentado em cima do bicho-papão. Então, diz o senhor Barata, e quando vo então você perce quando você percebeu, você deu um su um deu um levou um susto, deu um salto? Ele disse, não. Quando eu percebi, eu vi que ele não tinha perigo nenhum. Foi até o contrário, eu ajeitei a barriguinha dele e fiquei amigo dele. Então, diz ele, o o comunismo é o bicho-papão. Isto é, a hora que a gente perder o medo, ele não fará mal a ninguém. Isto é, era uma visão que era muito comum em mil novecentos e trinta e um, mil novecentos e trinta e dois, isto é, eh de que haveria uma evolução social, que essa evolução se faria naturalmente pela força da inteligência, porque eh certas ideias eh viriam por si mesmas, mas que não haveria absolutamente conflito nenhum. Me parece que este que é exatamente a atmosfera que a peça representa. Agora, esta parte toda da peça é quase que só conversa. A ação, propriamente, da peça não é uma ação baseada nessas ideias. É por isso também que a peça fez tanto sucesso e foi aceita por todos os círculos, porque ficava muito no plano da conversa. A ação, propriamente dita, era travada entre um mendigo, uma moça, que vivia com ele, chamada Nancy, e o Péricles, que era namorado da Nancy. Para este conflito, que é realmente o conflito central da peça, Não tem nada de ver com o restante, não tem nada a ver com problema social. É um conflito puramente de amor. Um conflito entre a velhice, que é o mendigo, e a juventude, que é o Péricles. E nesse conflito, o que se afirma é um conflito entre o dinheiro e a inteligência. O que vale mais? O dinheiro ou a inteligência? E o que a pleça conclui é que o que vale mais de tudo é a inteligência. Isto é, a inteligência seria um dom tão fabuloso que criaria uma compreensão entre todos os homens e que os problemas todos iriam ser resolvidos. Nós encontramos essa mesma crença em outras peças do mesmo momento, como, por exemplo, O Bobo do Rei, também do Joracy Camargo, onde é um um rapaz praticamente da favela, mas muito inteligente, muito culto, que vai para a casa do milionário, e nós verificamos então que a inteligência vale mais do que o dinheiro. Outra peça do Joaci do Joracy Camargo, também com intenções sociais e também interessante, é Anastácio, representado em mil novecentos e trinta e seis. Aí me parece que o optimismo já é bem menor. O Anastácio, ah ao contrário do do protagonista do Deus lhe Pague, que é o mendigo, Anastácio é um rapaz muito rico. rapaz riquíssimo Morre o pai, ele fica milionário. E quando termina a peça, ele está na miséria. E Então a peça é trajetória do Anastácio Aliás, ele acaba perdendo tudo, porque no início ele não se chama-se Anastácio. Ele tem um nome. Mas ele perde a fortuna, perde a função social, é preso pela polícia, eh enfim, perde o seu próprio nome, fica cha sendo chamado de Anastácio, Ele perde tudo. Por quê? Porque ele é um indivíduo bom demais, puro demais, ele é um cristão perfeito, ele quer aplicar sempre os princípios perfeitos da moral, os princípios perfeitos da religião, ele quer sempre é ser um irmão do próximo, então ao contrário, ele é explorado, ele é enganado e termina na última das misérias. E a última frase dele é o seguinte, eu perdi tudo, só não perdi a fé. Mas enfim, só ficou mesmo a fé, isto é não é assim uma conclusão (risos) tão optimista. Nós notamos que, em face o Deus lhe Pague, o Joracy Camargo agora está dizendo, não sei se o mundo vai ser tão perfeito, tão brevemente, talvez não seja, ao contrário, Talvez o mundo continue muito imperfeito, talvez as pessoas perfeitas, ao contrário, sofram com essa sua perfeição, mas eles têm apenas uma a seu favor alguma coisa, já não é mais a inteligência, uh a força da inteligência, agora é a força da fé. Então é levado preso, mas sempre com muita fé.  É uma peça que no fundo, uma peça amarga, deveria quase ser um drama mas que é apresentada como se fosse uma comédia porque o Joracy doura um pouco a a pílula para que o público aceite e ria e para que no fim a peça funcione do ponto de vista ah comercial. Também uma outra tentativa para renovação quanto ao tema seria a peça Sexo, do Renato Vianna, apresentada em mil novecentos e trinta e quatro por uma companhia do próprio Renato Vianna com o Jaime Costa. Como a palavra está indicando, a peça chama-se Sexo. Não preciso dizer qual é o tema dela. Isto é, o tema é a liberdade sexual. Um tema aliás hoje em dia muito mais ah atual do que naquela época. Mas, em suma, já estava começando a ser agitado. Então, a peça é curiosa, porque ela é muito antiquada, a meu ver, como forma, mas com preocupações que são, até o contrário, bastante atuais. Por exemplo, tem uma grande preocupação com a libertação feminina. A presenta as mulheres como vítimas de um homem através do casamento, em geral. O casamento sem amor, o casamento por dinheiro. E nesse casamento o homem tem todas as vantagens porque o homem continua com a sua liberdade sexual enquanto que a mulher perde ou nunca teve a sua liberdade. de maneira que (risos) a a a mulher era, em certos casos, co pa a peça apresenta, obrigada a castidade antes e depois do casamento. E há ah há uma frase na peça que eu notei aqui que as que diz o seguinte, ser mulher na sociedade que vivemos é ser a mais infeliz das criaturas. E a peça coloca também, no fim, a ques assim de maneira delicada, mas coloca, a questão do aborto, também, está sendo discutida, modernamente. E é uma peça curiosa porque já fala bastante em Freud. Não é, evidentemente, a primeira peça em falar em Freud, em psicanálise. Nós encontramos em outras peças anteriores. Mas essa me parece a primeira peça, assim, baseada, eh toda ela, sobre conceito psicanalítico, pelo menos em grande parte. Não só é baseada, mas, num certo momento, para mostrar bem isto, um personagem abre um livro para o público e diz, o senhor conhece o tal Freud, é formidável hein, e começa a ver os capítulos, consciente e inconsciente, você precisa ler isso, ( ) depois abre outro, repressão, e vai lendo e vê vários títulos, e há quase assim que uma propaganda ãh do do Freud, que ainda era uma novi uma certa novidade naquela década. E mais ainda, o personagem principal, que é o doutor Calazans que é o protagonista, Várias vezes tem uma indicação da peça, das rubricas. doutor Calazans, ele é quase que um um psicanalista, assim, intuitivo e um psicanalista, assim, imediato. Há várias indicações, então, na peça seguinte. D outor Calazans olha outra pessoa e penetra até o inconsciente dele () ( ) (risos) ele não precisa, inclusive, fazer nenhuma sessão de psicanálise, porque ele é tão vivo que ele vai diretamente e já vê o inconsciente. A peça é contra, portanto, a repressão sexual cont a favor de uma certa liber liberdade sexual Ela não define inteiramente seus os termos. Ela diz apenas contra o que ela é. Acusa violentamente a sociedade da época de ser uma sociedade hipócrita, de ser uma sociedade baseada na mentira, mas não diz exatamente qual é a revolução sexual que ela deseja. diz apenas que deseja maior liberdade do que até então existe. Agora, se o tema, portanto, são temas, assim, bastante modernos e que conservam a modernidade até hoje, a forma da peça ao contrário é uma forma muito melodramática. É um melodrama, quase, do século dezenove, isto é, inclusive com mortes, tiros, o personagem mata outro, finais de atos assim, para deixar o público sem saber o que vai acontecer no ato seguinte, para terminar de uma maneira, uma grande surpresa. E e também, ainda está muito ligado ao teatro do século dezenove, porque é muito uma peça de tese. Isto é, não é apenas uma peça de ideias, porque isso pode existir, peça de ideias, em qualquer época. Mas é uma peça de tese porque, sobretudo pelo seguinte, porque na peça há um personagem que é onisciente, que sabe tudo. Então, para resolver os problemas, basta perguntar a ele, que é o doutor Calazans, e ele diz. Nesse sentido, é um personagem muito parecido com o mendigo do Deus lhe Pague. O mendigo do Deus lhe Pague é uh alguém que sabe tudo a respeito de política. O mendigo pergunta para ele, como é que começou a propriedade? Então, ele dá uma pequena aula elementar sobre o marxismo. A qui, nesta peça, Alguém pergunta para o doutor Calazans como é este problema, ele tem a resposta sempre na ponta da língua. Isso dá um grande artificialismo a essas peças, porque eh toma um tom assim de de quase de conferência ah dialogada e não propriamente de teatro. Por exemplo, se nós compararmos com A Casa de Boneca, de Ibsen, que é uma peça escrita em fins do século dezenove, sobre o me da libertação feminina. Nós verificaremos que o Ibsen era muito mais moderno, porque a libertação feminina, na Casa de Boneca, é feita pela própria mulher. É a protagonista, a Nora. Ela tem uma série de complicações com o marido. Quando resolve tudo, e que ela pode voltar às boas com o marido, e o marido diz, agora está tudo resolvido, vamos viver, voltar realmente ao ponto de partida. Ela diz, não, agora eu não quero mais viver com você. pelo menos durante certo tempo. Diz por quê? porque eu quero adquirir a minha personalidade. Quer dizer, então aí é realmente um ponto de vista feminino, me parece, eh bem amadurecido. Não, sexo não é isto. Quem defende o ponto de vista das mulheres é um homem. Nesse sentido, ele está afirmando a superioridade dos homens sobre as mulheres. Está dizendo assim, a liberdade feminina será um dom que alguns homens bondosos inteligentes vão fazer às mulheres. Alguns homens que sabem tudo, e esses homens, então, vão, inclusive, fazer esta libertação eh feminina. Isto é, é uma peça que deseja ser moderna, mas que não consegue, está presa ainda a formas do passado. Também, (pigarro) eh ainda nessas tentativas eh infrutíferas de renovação, eu citaria O Amor de Oduvaldo Vianna, que é de Estão vendo que essas peças todas são de mil novecentos e trinta e dois, trinta e três, trinta e quatro, isto é, todas elas muito ligada ainda aos abalos econômicos e políticos de mil novecentos e trinta. Nesta peça, Oduvaldo Viana procura, sobretudo, uma renovação de técnica, porque o teatro eh começou a sentir, a partir de um certo momento, que o cinema tinha muito mais liberdade técnica do que ele. que o cinema poderia dizer as coisas com muito mais desembaraço, com muito mais desenvoltura, porque no teatro, em geral, as coisas ficavam estáticas. S Sempre no mesmo lugar, sempre dentro do mesmo palco, sempre dentro da mesma salinha. Enquanto no cinema, nós tínhamos, assim, quase que de minuto a minuto, uma variação no tempo e no espaço. E Então, o teatro, desse período, vai fazer um esforço muito grande para se equiparar tecnicamente ao cinema. Por exemplo, na Alemanha, eles vão inventar nessa década palcos complicadíssimos para fazer uma mudança ãh instantânea de cenário. No Brasil, nós vamos procurar soluções éh mais econômicas. Evidentemente, não poderíamos colocar um palco rotativo ou soluções desse tipo, que seriam muito caras. Mas, éh na peça Amor, do Valdo Viana, o que se fez foi o seguinte, uma subdivisão do palco em cinco áreas de representação. Então, no palco, no meio havia uma uma, um vamos dizer, um palco menor maio éh um palco principal, no centro do palco, e lateralmente haveria éh, em dois planos, assim, em altura, haveria mais éh quatro áreas de representação, a total cin Então, isso éh esse cenário múltiplo, quer dizer, o cenário não era mudado, era sempre o mesmo, a estrutura era sempre a mesma. Ma Através da luz, poderia se colocar tudo em sombra e, por exemplo, vamos supor, éh iluminar apenas um canto do palco. Então, ( ) uma cena ali apenas ali. Depois apagava e tínhamos uma cena exatamente no canto oposto. Poderia, então, fazer efeitos quase que de cinema. ( ) botei no amor. Uma pessoa liga o telefone, põe num canto. No outro canto aparece a telefonista, que naquele tempo havia telefonista, atendendo, fazendo a ligação. E depois, no outro canto, aparecia a pessoa atendendo o telefone. Para teatro, parecia isso uma maravilha, né? Parecia que o teatro estava exatamente como o cinema, estava com o dinamismo próprio éh do cinema e E então, nós temos uma ação extremamente sincopada. No Amor, a peça é compar compo Quer dizer, a trinta e oito vezes há uma mudança ou de lugar ou uma mudança de tempo. Quase realmente como se fosse uma fita de cinema. E o ritmo então é inteiramente outro. Também quanto ao próprio tema, o amor não deixa de procurar sair éh do esquema da comédia de costumes, porque o tema é o divórcio. E a peça, aliás, também no fundo seria um drama. Termina com morte, com tiro e E com a possibilidade que tem um homem que se divorcia de se casar com uma outra mulher solteira, porque a sociedade não aceita. O ponto de vista do conservadorismo, do conservador, é revelado na peça através de um person personagem chamado Doutor Catão. Pelo nome já se percebe como é a sua (risos) psicologia. Mesmo tempo ele é um purista na língua, Ele não admite nenhum galicismo, nenhum neologismo, e ao mesmo tempo ele também um defensor das ideias morais tradicionais e Ele é um defensor do casamento como um vínculo indissolúvel, porque ele é deputado também. Ele faz vários discursos num português perfeitíssimo, onde ele defende essas ideias. No fundo, a peça deveria ser um debate sério sobre o divórcio e até dramático, porque termina com a morte de um dos personagens Mas, como o público não aceitava bem o drama, novamente aqui, como no Deus lhe pague, este éh fundo de drama é envolvido numa capa de comicidade e a peça se apresentava com grande esforço como comicidade. Está havendo, então, várias tentativas éh para sair, para dizer alguma coisa, para fazer um teatro éh diferente. No fim da década de trinta, me parece, que esse ímpeto renovador já se esmorece e o que vai predominar no fim da década é, sobretudo, o teatro histórico. Então, os grandes sucessos hm de mil novece A Marquesa de Santos, de Viriato Corrêa, interpretada por Dulcina e Odilon. Dulcina, naturalmente, fazendo o papel da Marquesa de Santos Odilon, de Pedro I. E Carlota Joaquina, do Ramiro Magalhães Júnior. E apresenta Dom João Sexto, numa grande interpretação de Jaime Costa Isto é, a meu ver, uma visão bastante convencional da história. () diferente, por exemplo, de peças históricas recentes, como vamos supor, Arena Conta Tiradentes, onde a história é posta em questão, onde a história é discutida, onde se quer ter um novo conhecimento a respeito do passado a Aqui, ao contrário, trata-se de uma visão extremamente convencional e popular da história. Aqui, a Marquesa de Santos, exatamente como todo mundo imagina que ela deveria ter sido. Pedro Primeiro, como todo mundo sabe que ele é, éh gritando, puxando espada, impetuoso, enfim, sem nada que fuja à imagem popular. Porque, exatamente, o que se procurava era o sucesso, e para ter o sucesso era preciso que a peça éh correspondesse à expectativa éh do público. E também, já neste fim da década d nós encontramos um teatro também como um grande sucesso, um teatro que podemos chamar de pseudo-histórico, isto é, um teatro o onde a história aparece como fundo, mas onde os personagens são éh fictícios. Então, eu citaria um autor que fez muito sucesso no fim da década, que é Ernani Fornari, autor de Iaiá Bonec, mil novecentos e trinta e oito, na interpretação de Eva Todor, e Sinhá Moça Chorou, na interpretação de Dulcina, em mil novecentos e qua renta. Aliás, pelos título da peça, A gente já tem ideia mais ou menos do que elas são. Que são títulos assim, vamos dizer, um pouco dengos os. Sinhá moça chorou. Iai ia boneca é Éh, se vê logo, ãhn, são títulos éh sentimentais. E as peças realmente são peças muito piegas. Peças ah que se baseiam numa concepção da mulher também muito tradicional e muito convencional. A mulher é um ser éh frágil, é iá iá boneca, isto é, tem alguma coisa da iá iá, da sinhá, mas é uma boneca, tem alguma coisa de boneca, não é a mulher como um ser mais ou menos semelhante ao homem, mas alguma coisa inteiramente diferente, muito delicado, que precisa ser apresentado através de uma imagem poética, que precisa ser poetizado, mas uma poesia também, ela, de um romantismo já muito fora da moda, porque o romantismo, afinal de contas, já tinha mais de um século. Na Sinhá, moça chorou, por exemplo, ó o plano de fundo é a Guerra dos Farrapos, de mil oitocentos e sessenta e quatro a mil oitocentos e qua Então, há um um caso de amor entre Flor, que é gaúcha, e o Felipe, que era do Rio de Janeiro. Quando há a guerra, eles se amam. Quando há guerra, um está de um lado e o outro está do outro, na guerra. O Felipe é mandado exatamente como militar para combater os gaúchos. Então ele, há um conflito irremediável, aparentemente, entre ele e ela. Há todos os recursos melodramáticos tradicionais. Por exemplo, em certo momento, corre o boato que o Filipe morreu. Isso durante muito tempo. No fim, o Filipe reaparece, não tinha morrido nem nada, e há uma reconciliação, e tudo termina bem, e a dona e a dona Flor, não, porque isso já é Jorge Amado, e a Flor se casa com o Filipe, isto é, éh no fim, a peça é um romance de mocinhas, transposto para o palco é É um exemplo, a meu ver, típico de subliteratura, éh apegada assim a modelos muito já ultrapassados a Aqui nós já estamos encaminhando para a telenovela. que é mais ou menos éh esse tipo de peça e a boneca, se ( ) chorou, é é um tipo já de de enredo de personagem que poderia ser aproveitado na telenovela. E fato, Nesse fim da década de trinta, não existe ainda, evidentemente, telenovela, mas já existe rádio-novela, que já cria um certo tipo de ambiente. O Duvaldo Vianna, por exemplo, larga praticamente o teatro para se dedicar à rádio-novela, isto é, o teatro está perdendo terreno para outros ãh concorrentes. Todas essas tentativas de renovação que até agora eu dei, porque enf essas mesmo, mesmo esse teatro histórico, procurava renovar, na medida em que oferecia ao público um grande espetáculo, como o cinema oferecia, isto é, Marquesa de Santos, ou Carlota Joaquina, ou mesmo, sinhá moça chorou, é um esforço do teatro para apresentar um daqueles grandes espetáculos de Hollywood, éh como o Hollywood fazia, Apresentar ao público, não uma comediazinha com cinco ou seis personagens, mas apresentar ao público um espetáculo com trinta, quarenta personagens, em s dez, doze quadros, com várias mudanças de cenários, com roupas da época, com roupas bonitas, para ganhar o público, pelo menos para esse lado, do luxo e Então é uma tentativa também de renovação. Todas essas tentativas de renovaçã sempre ficaram dentro do âmbito do teatro comercial, isto é, aceitar o funcionamento do teatro comercial, tal como ele existia, e dentro desse âmbito procurar renovar, sem conseguir inteiramente, a meu ver, pelo menos ago ra vamos éh aludir, apenas de passagem, porque não há tempo para desenvolver, as tentativas de renovação feitas fora do âmbito do teatro comercial, que já são muito menos típicas da década de O que é de típico da ( ) de trinta é esse teatro comercial sobre o qual nós estávamos falando a gora vamos ver algumas forças que começam a surgir em trinta, mas que realmente só vão se afirmar e só vão triunfar na década seguinte, isto é, na década de quaren enta em primeiro lugar, a renovação proposta pelo modernismo. não obstante o modernismo, na década de trinta, já havia renovado a poesia, já havia renovado o romance, mas em relação ao teatro, e ele muito pouca coisa conseguiu. Mas alguma coisa ele fez. Ele fez, sobretudo, através de duas pessoas u Uma, que é o Antônio de Alcântara Machado, que, como crítico de teatro, escreveu muita coisa, que é muito interessan porque ele não só cri criticou violentamente o teatro tal como se fazia naquele momento, mas como ele propôs éh novas novos modos, novos modelos para o teatro, modelos que depois vieram a ser adotados vinte ou trinta anos depois da sua morte e Ele achava, assim, resumindo muito, porque isso enfim seria uma questão que precisaria ser desenvolvida muito mais a fundo, Ele achava que o teatro brasileiro, ou a salvação para o teatro brasileiro, não deveria estar nesse chamado teatro culto, que seria um teatro muito falso, mas deveria estar, ao contrário, no teatro popular e Ele tinha uma grande admiração, então, pelo circo brasileiro, especificamente pelo Piolín, que está até hoje ainda representando, e também pelo teatro de revista, que dizia, pode ter todos os defeitos, mas pelo menos nos dá uma imagem, ainda que deformada, do que é verdadeiramente o Brasil e Enquanto que o teatro éh culto, ou teatro comercial, não nos diz nada a esse respeito. Diz ele, o teatro de revista é o espelhinho vagabundo através do qual o Brasil se contempla. Não dá uma imagem exata, mas diz alguma coisa a nosso próprio respeito. Ele achava, então, que a salvação do teatro brasileiro, eu vou ler aqui um trecho dele, apenas um trecho, porque ele escreveu muito sobre isso a A salvação do teatro brasileiro estaria, diz ele, no popular. Que venham a faça grosseira, a comédia de costumes, os galãs de pé no chão, as engenas do subúrbio, o folclore, o samba, o carnaval, a feitiçaria, o vernáculo estrupiado, os dramas do sertão, flores de papel nos lustres, carapinhas, dentes de ouro, a fala e o ambiente, graças e desgraças, da descivilização brasileira. ( ) (risos) dá aqui um roteiro praticamente muito do que o teatro fez recentemente, nos últimos dez anos mu muitas tentativas do teatro de arena e também do teatro oficina foi exatamente nessa direção, de buscar uma comicidade autenticamente brasileira e de procurar o que que o teatro brasileiro poderia exprimir de mais autenticamente éh popular o Outra experiência, também modernista, muito importante na década, foi, como sabem, o Rei da Vela do Oswald de Andrade, que foi escrita e Exatamente, no mesmo momento estava escrevendo Deus lhe pague, sexo, amor e com as mesmas preocupações no fundo. É uma peça éh preocupada com os a a assuntos econômicos e com uma visão de esquerda, exatamente como Deus Lhe Pague. É uma peça preocupada com os problemas sexuais, exatamente como o am, como, o sexo e também, em parte, como o amor. Só que ela propõe esses problemas éh realmente com marginalidade infinitamente maior e com uma agressividade, com uma virulência que não se compara, porque enquanto os outros procuravam éh renovar, mas não tendo a coragem de romper com os moldes comerciais do teatro, aqui o contrário, ele rompeu inteiramente com todos esses moldes e propôs uma outra forma, isto ele compreendeu muito bem, que para fazer um teatro revolucionário, ele tinha que fazer um teatro também de forma revolucionária, e foi o que ele fez Um teatro de forma tão revolucionária, que no momento passou despercebido, não fez o menor sucesso, não foi apresentado, polícia também não deixa ninguém leu, ninguém comentou, praticamente não existiu na década de trinta, mas veio ressurgir com muita força em mil éh novecentos e sessenta e oito, que é trinta anos praticamente depois, e ao contrário, veio estourar como uma espécie de bomba extremamente moderna, porque mostrou que inclusive, pelo espírito, estava muito próximo a certas experiências do teatro atual, porque Nós podemos dizer quase que o Rei da Vela não é uma peça, é uma anti-peça. Não é um teatro que ele pretende escrever, é um anti-teatro is to é, ele pretende com essa peça destruir tudo aquilo que se havia feito e começar tudo de novo. É uma peça éh violentamente paródica em relação ao próprio teatro. e nesse sentido ser paródica, profundamente destruidora. Tinha que ser destruidora porque precisava se destruir o teatro antigo para nascer o teatro moderno. Da mesma maneira como no modernismo havia esses éh germes que não chegaram inteiramente a florescer na década de trinta, também começou na década de trinta um movimento grande de amadores que iriam, que iria dar seu fruto apenas na década de quarenta. e E foi realmente do movimento dos Amadores que nasceu a renovação do espetáculo c ito apenas o nome, no Rio de Janeiro, o Teatro Estudante, Pascual Carlos Magno, Os  comediantes de Santa Rosa, tudo isso no fim da década de trinta, mas realmente tudo isso apenas se afirmando na década de quarenta Em São Paulo, o trabalho pioneiro de Arthur Mesqui começando a fazer as suas primeiras peças, o Alvo Moreira, que já havia con, tentado fazer alguma coisa nesse sentido em mil novecentos e vinte e sete com teatro de brinquedo, e que durante a década de trinta continua fazendo algumas experiências, mas não inteiramente éh sucedidas. Nós éh podemos dizer que éh realmente o que os amadores fizeram foi formarem na década de trinta um nú de pessoas, agrupar os interessados que só foram agir com efetividade na década seguinte e realmente renovar o teatro o defeito do moder dos modernistas é que eles queriam éh fazer uma mudança literária no teatro sem modificar o espetáculo ( ) Ora, isso não é possível. Nós só podemos ter uma peça nova quando nós temos um espetáculo também imaginado em termos novo como os amadores se interessaram pelo problema do es do espetáculo, e como depois vieram os encenadores estrangeiros que renovaram o espetáculo, então mais tarde foi possível escrever um teatro novo, depois que o teatro tinha se renovado quanto ao espetáculo. Também não quero terminar sem dizer alguma coisa a respeito de quase de um subteatro, de um teatro que geralmente é esquecido, mas que teve sua importância, que é o teatro de revista, hoje em dia praticamente mor nascido em fins do século dezenove, com uma certa importância naquele momento. Para o teatro de revistas, me parece, a década de trinta marcou realmente o fim. Por dois motivos. Porque o teatro de revistas baseava-se, por um lado, na crítica política, do outro, na música popular o Ora, no que se refere à crítica política, na medida em que o Getúlio foi o gover o governante do Brasil durante uns dez anos, essa crítica éh tendeu a não se renovar. Porque, no início da década, o teatro de revista foi, de maneira geral, muito favorável ao Getúlio. Foi muito getulista. O Getúlio aparecia sempre no teatro de revista como um indivíduo muito malandro, muito esperto, mas muito simpático e muito brasileiro. No fim, dava um golpe em todo mundo e ele que vencia. todas paradas a gora, quando entrou o Estado Novo, já no fim da década, nem essa imagem mais não éh pôde aparecer nos papos de revista, porque com a o arrocho da censura, a a revista perdeu inteiramente o seu caráter político, até o fim do Estado Novo. Quando acabou o Estado Novo, a revista já não era mais a mesma, já era um sh mero show, e tinha esquecido aquele seu conteúdo político e E com isso, esse lado desapareceu por completo. Quanto à música popular, também, que a o teatro de revista tinha tido uma função muito importante nos primeiros, éh de mil novecentos até mil novecentos e trinta, para propagar a música popular o O teatro de revista era o instrumento de propagação da música popular a Agora, na década de trinta, ele vai perder essa sua função para o rádio, através do disco. E, realment os cantores éh famosos dessa década, por exemplo, vamos supor Francisco Alves, Carlos Miranda, começaram fazendo teatro de revista, mas logo a seguir abandonaram, se dedicaram apenas ao rádio e ao disco e o teatro de revista, não tendo mais nenhuma das duas funções, deixou de ter função qualquer e desapareceu. Agora, para terminar, fazendo uma visão geral desta década, nós poderíamos dizer o seguinte, A década ( ) começou com um ímpeto renovador, um ímpeto revolucionário muito grande, devido exatamente aos acontecimentos políticos e econômicos e E nesse respeito eu vou dar aqui um testemunho do Joraci Camargo, escrevendo a respeito de Deus de pague e Ele diz o seguinte, que ele tinha notado que no Brasil nem tudo era perfeito. Desconvenci-me que o Brasil era uma grande mentira. Mas ele não poderia dizer isto, Amigos mais experimentados do que eu fizeram desistir da ideia. Disseram, você está maluco? Governo é governo. Manda quem pode. O mundo é dos espertos. Eu também sei que há desonesto da política, analfabeto do magistério, covardes da magistratura e escritores ignorantes. Mas infelizmente nós temos que nos conformar não há outro remédio a Argumentos poderosíssimos d Desisti. Mas quando me fiz escritor de teatro, Fui instintivamente botando para fora tudo o que eu havia recalcado. Notei que o povo gostou v Vieram revoluções e Eu assisti embasbacado a queda de um presidente da república. Embasbacado porque fazia já quarenta anos que o presidente da república não era... não caía aqui no Brasil. Depois se tornou mais frequente. Mas... éh (risos) de lá para cá tem havido uma série de de de golpes éh m Mas éh até então não. Então, realmente, causou uma espécie de ( ) facção e E que presidente, diz ele Que, realmente, o o Washington Luiz era um homem extremamente autoritário j Já governo não era mais governo c Carreguei um pouco mais na mão e Escrevi O Bobo do Rei a Agradou o O novo governo começou a fazer concessões que eu teria considerado absurdas su Surgiu um decreto contra a usura. Até o Papa me surpreendeu, na última encíclica, defendendo os direitos do operariado contra a ganância do capitalismo. Foi assim que se formou na minha cabeça a comédia de Deus lhe pague. Escrevi em poucas noites, já estava pronta na cabeça. Quer dizer, mostra bem aí a correlação que existe entre esta série de acontecimentos, essa espécie de estremeção que que o mundo sofreu em mil novecentos e trinta, e essas peças todas éh renovadoras. Depois, na medida em que as revoluções éh não se realizaram, há então o que hoje éh aconteceu, ah um fenômeno muito semelhante aconteceu recentemente, isto é, éh em relação a todo esse ímpeto revolucionário, aconteceu, como diz um um dos Beatles, the dream is over, isto é, esse sonho acabou, é a aquilo todo não deu mais ou menos em nada e E, entã Veio no fim da década, o teatro histórico, exatamente, talvez por não se poder falar do presente, a partir de mil novecentos e trinta e sete, então vem as invocações saudosas do passado e há toda essa onda de saudosismo, de passadismo, Marquês de Santos, ãh Carlota Joaquinas, enfim, as mulheres ilustres da história brasile E assim termina o nosso assunto. Isto é, ah me parece, numa última revisão, que toda essa década é um esforço que não chega quase que a nada u Um esforço muito louvável No momento, éh não há dúvida nenhuma, eu participei de todos esses entusiasmos. Eu assisti Deus lhe Pague na ocasião em que a peça surgiu. Para mim era uma coisa extraordinária. Depois assisti o Amor. Achei que o teatro estava dando assim um passo adiante imenso d Enfim, assisti o Sexo. Um amigo meu de geração escreveu uma crítica entusiasmadíssima a respeito. Enfim, as coisas estavam mudando. O teatro também estava evoluindo est ava mas no fundo, tudo isso que estava preso ao teatro comercial fracassou porque não conseguiu romper com as suas raízes éh éh do passado. O teatro modernista ficou apenas com projetos literários que não passaram para o do do plano do papel para o plano do palco o O amadorismo estava apenas reunindo forças, não realizou nada de importante ainda nessa década. Podemos dizer então que a década de trinta foi uma década que encerrou, talvez, um certo período, fez tentativas de renovação e não conseguiu, mas foi apenas um período de amadurecimento para as reformas muito mais importantes do plano de ciência teatral que se realizaram na década seguinte. ( ) (risos) (tosse) bom autor estrangeiro O teatro que predominava era o teatro cômico. Isso eu disse de passagem mais de uma vez e Então, (tosse) que eu me lembre, ( ) para dizer a verdade, eu não estudei esse assunto. Mas enfim, pelo que eu sei, no começo da década, o Procópio representava muito farsas espanholas, comédias espanholas. E também, às vezes, comédias francesas al Algumas argentinas m Mas... Agora, a Dulcina, quando ela fundou uma companhia, Fond du Nom, em mil novecentos e trinta e quatro, aí esse respeito para a estrangeira me parece que houve um progresso muito grande. Porque ela fez um repertório também francês, um repertório do teatro Boulevard, Mas, por exemplo, o autor predileto dela, não sei se você conhece, é Luiz Verneu, que era um autor cômico de muito sucesso naquele momento, na França também. Mas ela fazia mais bem feito do que o Procópio e Eram espetáculos mais cuidados, de maneira que éh o Procópio, às vezes, por causa... para o espetáculo caber naquelas duas sessões, o Procópio, às vezes, cortava muitos personagens, Não sei se o ( ) Magalhães Júnior falou alguma coisa a esse respeito, deve ter falado, né? Porque eu... tem um artigo dele sobre o Procópio, onde ele conta que o Procópio pegou peças, assim, por exemplo, de dezoito personagens e cortou para nove e a Aliás, com o auxílio do próprio ( ) Magalhães Júnior e Portanto... éh e o (risos) e o Procópio, quando ia em excursão, cortava mais ainda, né? Não sei se ele contou esses casos ele contou, né? O telefone, que não... Ele contou isso ou não? n Não? Ele contou, então eu ( ) vou contar, mas éh é a história é contada por ele mesmo, ( ) Magalhães. Ele diz, aquelas duas velhinhas que conversavam e tal, ( ) da sua peça, eu cortei uma. Mas como você cortou uma? a Ah, bom eu fiz ela falando no telefone, com a outra. E como ela é meio surda, ela repete tudo que a outra fala (risos) Então, o público ficava sabendo o o que ela falava e o que a outra falava. Então, o Procópio tinha todas essas técnicas de cortar personagem (risos). Ele levou o Deus lhe Pague, no interior, e algumas vezes, que ele levava com três personagens apenas, ou dois o O resto era cinema, ele filmou (risos) a última cena. Então, a ce algumas cenas vinha ele e o e o Barata, e falava aquelas cenas, as coisas conversadas. Depois outra outras coisas eram filmad Ele fez tudo para poder realmente... éh o Procópio era um um ator, assim, Eu acho qualidades cômicas brilhantíssimas de um ator, um dos mais engraçados que eu já vi em todos os teatros de todos os países. Mas como empresário, principalmente à medida que foi passando o tempo, ele foi se comercializando cada vez mais a A Dulcina, não. A Dulcina e o Odilon sempre tiveram assim um empenho artístico muito maior. Então, éh comparando espetáculos estrangeiros do Procópio, não me lembro ter visto nada importante feito pelo Procópio nessa década, de peça estrangeira. e da dulcina não eram comé Eu sei que o Otávio de Faria escreveu, mas não foi representado. Otávio de Faria era de direita e Escreveu ele era é que ele era católico naquele tempo, na década de trinta, nesse começo. O catolicismo era de direita e E ele, além disso, só não é só por ser católi Ele, pessoalmente, (risos) as coisas mudaram u Mas, ãh além disso, ele era teve ( ) pelo Mussolini, escreveu um livro sobre isso e escreveu uma peça chama-se Três Trajetos Sobre a Cruz para dizer para ser honesto, eu nunca li essas peças, nunca foram (risos) nunca vi e nunca li. A única apreciação que eu vi foi do do do do Oswald de Andrade, mas é uma opinião muito suspeita que o Oswald Andrade era contra, evidentemen nte então eu me lembro que o Oswald dizia que o Otávio Faria era o maior dramalhurgo do Brasil (risos) (risos) Isto é, autores dramalhões (risos) a sério, né? Ah Eu não posso dizer mais nada, por não nesse eu acho que não houve um teatro de direito nesse ( ) dessa década que eu me lembre não bom esse retrocesso não foi só do teatro quer dizer isto foi um pouco toda a atmosfera do brasil Ãh de maneira que... (tosse) e além disso, também a crítica naquele momento não tinha importância que passou a ter com a renovação. Porque essa renovação atingiu, inclusive, a crítica. Eu li agora, recentemente, uma tese de mestrado de uma moça que estudou o teatro brasileiro em mil novecentos e trinta, trinta e um e trinta e dois Mas não propriamente as peças, mas esses hábitos, costumes, através dos anúncios. E ela diz lá uma coisa que é muito justa e que para nós também parece estranho a A crítica naquela época estava muito ligada às empresas. Porque, em primeiro lugar, o crítico recebia, em geral, uma porcentagem dos anúncios de teatro. Então não tinha nenhum interesse em éh é em (risos) criticar e atacar uma peça. Porque o empresário, o gerente cortava o anúncio, o gerente do jornal reclamava com o crítico, e o crítico ganhava também do anúncio, então né éh éh havia assim uma espécie assim de interesses éh recíprocos a Além disso, o crítico tinha uma permanente, todas as noites, ele tinha dois lugares todas as noites. Essa permanente era muito disputada no jornal, de maneira que toda toda a redação ia assistir o teatro com a permanente, não é? Cada dia um, não é? Então, todo o teatro tinha... todo teatro, não, perdão, todo jornal, toda a redação, dizer assim, tinha interesse em não brigar com a companhia, para não perder a permanente. E o (risos) o crítico não era, provavelmente, um sujeito especializado em teatro. O crítico era um redator qualquer que gostasse um pouco mais de teatro, ele ia lá, mas, realmente, a função dele era uma função de redator dentro do jornal. Quando havia uma companhia estrangeira, isso se dizia. éh quando havia uma companhia estrangeira, o critério para a escolha do crítico, a pessoa ia criticar a companhia estrangeira, O critério era era duplo, em primeiro lugar, é claro, precisava entender um pouco da língua que se falava. isto é se era francês, ( ) a pessoa da redação que falasse um pouco de francês. ou que o que entendesse E segundo, muito importante, precisava ter smoking Porque, naquele (risos) tempo, as companhias estrangeiras eram todas com traje a  rigor. Então, se perguntava a alguém que tivesse, fosse um redator qualquer, que tivesse smoking, entendesse um pouco de francês e tal, e fazia a Agora, essas crônicas eram m feitas frequentemente na própria noite, eram coisas muito curtas, que praticamente não dizem quase nada sobre o espetáculo, sempre terminam dizendo o espetáculo agradou, sempre, éh nunca faziam-se restrições muito fortes, e muitas vezes, a c ou geralmente, a crítica era, não digo sempre, mas muitas vezes a crítica era feita na própria redação do jornal, sem o crítico sair do jornal. com informações e tal e E houve casos, por exemplo, do espetáculo não poder ser realizado por esse por aquele motivo, incêndio e tal, e no dia seguinte saía a crítica do jornal (risos) a Havia um crítico no Rio, que eu cheguei a conhecê-lo, que não tinha opinião nunca a respeito e Então, nos intervalos, ele reunia com os outros críticos, quatro ou cinco e tal, e ficava ouvindo a opinião dos outros, para depois dar a opinião dele no jorna Todo mundo sabia disso, né? Então um dia resolveu e fizeram o seguinte. Todo mundo tava achando a peça péssima, né? Mas (risos) combinaram entre si e no intervalo todo mundo elogiou muito. acabou, formidável e tal. No dia seguinte ele foi o único que elogiou a peça (risos) quer dizer havia (risos) e Era muito diferente, sabe? ( ) Realmente, a renovação que houve no teatro foi muito profunda. Começar pela crítica. Quando eu comecei a fazer crítica no no estado de São Paulo, em mil nov Eu recebi um uma uma carta de um de um uma pessoa um agente de publicidade da companhia que escreveu ao diretor do jornal reclamando que eu tinha criticado a peça, que não era hábito do jornal. (tosse) e o diretor me chamou e mostrou a carta e disse, o que que há (risos) aí? Bom, o que há é que nós estamos agora fazendo uma reno procurando fazer uma renovação do teatro e tal, então uma das coisas precisa se criticar as peças que são ruins. O diretor disse, está bom, então por isso encerrou o assunto m Mas ele realmente ainda tentou exercer essa influência e Ele não o exerceu, porque como o Estado de São Paulo, que o Procópio escrevia, era um jornal muito forte economicamente, num num cedeu essa pressão, mas havia essas pressões todas s

SPEAKER 3: : Síntese?

SPEAKER 0: : Exato e

SPEAKER 3: : Exato. exato

SPEAKER 2: : Exato i Isso é muito claro porque, éh éh me parece, o que eu reli essas peças agora, eu já conheci mas reli ( ) De ( ), a gente vê aqui, o ( ) Vianna, o ( ) Camargo, o Renato Vianna, eles tinham preocupações sérias e tinham preocupações ãh muito atuais naquele momento a Agora, eles não tinham coragem de tratar seriamente essas preocupações sérias a Às vezes, geralmente eles davam sempre, éh pelo menos a forma da comédia, uma coisa mais inconsequente, para o público, ( ) cenas engraçadas, para que o público poder aceitar is isto o Nesse ponto, o o Renato Vianna é o mais corajoso, não há dúvida nenhuma. Renato Vianna, ele moralmente, ele é um homem extraordinário. Ele sempre fez um teatro com muito menos sucesso do que os outros, sempre procurou renovar o teatro, e ele e ele aceitava muito mais do que os outros que o teatro não agradasse ao públi Agora, o Juracy Camargo, na medida que ele escrevia para o Procópio, o Procópio era um ator cômico de primeira ordem, que tinha um público certo, que ia lá para ver o Procópio. Tudo isso tinha uma força muito grande, e de maneira que o público exercia uma influência sobre os autores, o auto os autores aceitavam, por sua vez também o público não se renovava por causa disso, era um círculo fechado, né? e Então há uma espécie d de luta para sair disso, mas éh sem conseguir inteiramente. É que exatamente foi o que a senhora disse, né?

SPEAKER 3: : Me parece ()

SPEAKER 2: : O Rei da Vela? mil novecentos e sessenta e oito Eu assisti, assisti a estreia  Mas aí era completamente diferente o ambiente é É? hum Nunca foi apresentado. Nunca foi apresentada, porque para começar, naquela momento, quando a peça foi escrita, a peça não poderia ser representada de maneira alguma a A censura, vocês não éh podem ter uma ideia, não podem imaginar o que era a censura. Principalmente durante o período do Estado Novo e Eu comecei a fazer teatro amador, dirigi um grupo exatamente em mil no Eee... e eu por exemplo, vou citar alguns casos para mostrar como era a censura o Para uma peça do Martins Pena, que é um autor do século passado, de mil mil oitocentos  e quarenta e E, numa cena, uma menina esconde o namorado no armário. Depois, quando abre, o rapaz sai, e a e uma velha diz, então, com o quê? A A senhorita tinha os amantéticos escondidos no armário? esse amantético deve ser namorado, né? A censura riscou, não pode por a palavra amantético. Quer dizer, censurando um texto de mil oitocentos e quarenta de um autor éh como Martins Pena, que foi apresentado na ocasião. Depois, uma peça éh escrita naquele momento, mil novecentos e quarenta e três, uma peça de um de um escritor, Mário Neyme. O indivíduo falava assim, éh eu vou na Secretaria da Fazenda ver aquele negócio para você. Riscado, Secretaria da Fazenda, não pode falar Secretaria da Fazenda (risos) éh (tosse) Depois, o Chico falava assim, por causa da guerra, riscado, não pode falar em guerra. O Brasil estava em guerra, tinha declarado guerra, tinha mandado inclusive um um contingente de forças para a Itália, (tosse) e no teatro não podia falar que estava em guerra. Riscado. E, para ir dando alguns exemplos, né eu vi u vi uma empregada, a dona da casa, dizia, esta... não gosta dessa cara dessa empregada, ela tem cara de gatuna. Riscada a palavra gatuna, não pode falar. Quer dizer, éh exatamente assim que era a censura a A censura de hoje, não se pode comparar, é extremamente liberal com a censura daquela época. Porque... éh houve uma mudança geral em toda a sociedade brasileira, de maneira que os próprios censores, sem perceber, são avançadíssimos em relação aos censores de trinta anos atrás. De maneira que éh a a peça, na época, nem ocorria alguém a representar e E também, é uma pe não é só por motivo de censura, Era uma peça que fugia tão completamente a tudo que se fazia em teatro no Brasil naquela época, que realmente parecia, assim, uma loucura, uma extravagância ### ### ### ### ### os cri os critérios eram sempre vagos porque a lei fala em termos gerais. éh de maneira que a interpretação realmente é dada pelo censor num há um Nunca houve critérios éh perfeitamente definidos. E de maneira que, me éh mesmo recentemente, vamos dizer, nos últimos cinco anos (tosse), ah varia muito ah. Depende do sensor que veste a peça, éh depende, às vezes, de contatos pessoais, a pessoa em Brasília, conversar, falar. Bom, mas isso está fora do nosso assunto. Naquela época, também, ãh éh os os critérios eram muito vagos. Mas há penas, como a nossa sociedade brasileira era muito mais puritana do que é hoje, Os critérios, então, normalmente eram mu esrt, muito mais severos, incomparavelmente mais severos do que agora. De maneira q ue o a peça do Wal do do Oswald Andrade não não é só que não foi representada, também não teve repercussão na época. O ### como se entende mesmo a popularização modernamente, isto é, de tea... levar o teatro para... popularização no sentido de levar, por exemplo, a camadas de operários, assim, camadas... Nesse sentido, não havia essa preocupação. Essa preocupação, não só no Brasil, mas no mundo ocidental, de uma maneira geral, é muito recente. Mesmo na França, na Itália, isso ocorreu nos últimos dez, quinze anos. éh éh agora, o preço do teatro, por exemplo, do Procópio, que ele fazia, e o Jaime Costa também, eram talvez mais acessíveis do do que o teatro comercial de hoje. Isto é, o teatro foi como uma companhia, eram companhias fixas () Isto é, hoje em dia, em geral, cada peça tem um elenco especial montado para aquele espetáculo. Naquela época, não. A companhia era paga o ano inteiro o O cenário era simples. Tudo isso barateava, evidentemente, o custo de cada uma das produções. Então, o teatro e também o nível dos atores era o nível, em geral, éh assim socialmente, economicamente, mais baixo do que é, talvez, hoje em dia. Então, éh os atores levavam uma vida modesta, mas éh mais ou menos éh com segu mais ou menos garantida, mas modesta. Então, o teatro era era barato, relativamente o O Jaime Costa, por exemplo, no Rio de Janeiro, o público dele não era... granfino, nem alta burguesia, era pequena burguesia do Rio de Janeiro, funcionário público, tudo isso poderia ir, naquela época, podia ir ao teatro e Esse estudo não foi feito, estou dizendo assim de ah impressão que eu tenho, mas eu nesse ponto eu acho que hoje em dia o teatro talvez esteja mais caro do que estava naquela época. Porque o espet o teatro hoje em dia é um espetáculo mais caro do que que era naquela época. Era um espetáculo simples, modesto, então era barato. O primeiro ator, Procópio, ganhava muito. Procópio ganhou rios de dinheiro. Mas os outros atores, em geral, ganhavam pouco e levavam aquela vida simples, né? (tosse)

SPEAKER 1: : Nelson, você não falou num artista que ÉH vem se mantendo até hoje, parece que é dessa época, também o O Raimundo Magalhães não falou. Dercy Gonçalves.

SPEAKER 2: : Ah, sim Porque Dercy Gonçalves, eu falei um pouco do teatro de revista mas... Eu acho que realmente o sucesso dela é mais recente. É mais recente éh A Dercy, ela o sucesso dela é mais a partir de mi mil novecentos e quarenta também el Ela, (tosse) eu não tenho certeza (tosse), mas eu creio mil novecentos e trinta, entre trinta e quaren renta ela estava fazendo ainda, ela já estava começando a se preparar, mas ela só veio a se formar como como atriz posteriormente. A Aliás, o teatro de ativista eu não falei nenhum nome, né? A Haveria talvez outros nomes. éh o que é realmente o importante de mil novecentos e trinta seria Oscarito antes de passar para o teatro, Mesquitinha, éh Margarida Max é mais mil novecentos e vinte, mil novecentos e trinta, haveria enfim uma série de a de a de atores e atrizes de revista, esse aspecto eu não falei porque também o assunto era muito vasto e revista eu disse apenas que ele foi perdendo importância nesse período, agora Dercy realmente o Ela já fazia teatro, ela fazia teatro do Ca do Caboclo. Ela estava começando, mas realmente ela se ( ) ela demorou para ter coragem de afirmar a sua personalidade, que personalidade muito (risos), assim, diferente, excêntrica. E a pessoa não pode aparecer assim de um momento para o outro ela ( ) Ela mesmo custou para se afirmar perante o público, demorou mais.

SPEAKER 1: : Ela já apareceu, já... Na minha pergunta foi exatamente por por este aspecto da crítica que você citou. Então, eu perguntaria se naquela época poderia existir uma Dercy de hoje. A

SPEAKER 2: : Ah, sim. O O teatro de revista era dife rente o teatro de revista havia muita liberdade. A Era o critério era diferentes. Sendo revista, as coisas eram permitidas. Porque, aliás, em críticas da época, éh nessa tese de de mestrado, que eu li, isso é bem isso é bem revelado, bem claramente. A Havia uma diferença muito grande entre o teatro, propriamente dito, e o teatro de revista. Porque o público era diverso. Então, havia um teatro chamado Livre. Então, o crítico diz, o teatro Livre é um teatro onde vão as pessoas casadas ou emancipadas, diz ele. E Esse emancipadas, a gente pode interpretar aí da maneira que quiser (risos), isto é? (risos) Se Seriam ah ah os homens, naturalmente, poderiam ir, as mulheres poderiam, depois que se casassem, ao no braço do marido, ou então, na medida em que elas se emancipassem. Mas ah o crítico faz uma observação, que estavam lá, ele ficou muito chocado com uma peça, porque lá ele viu várias senhoritas, ou que pelo menos assim o pareciam. (risos)  (risos) então, para esse tipo de público, aquela peça absoluta não era recomendada, isto é, havia uma demarcação de público, no Teatro da Revista a liberdade era muito grande. A Agora, era uma liberdade diferente da atual, porque Atualmente, a liberdade é a liberdade de palavra, inclusive de palavrão (palma) E Isto é, as coisas são ditas. Naquela época, mesmo de teatro revista, as coisas não eram ditas, era malícia, diferente, né? E Isto é, as coisas eram insinuadas, mas eram insinuadas (tosse) de uma maneira muito clara, todo mundo compreendia perfeitamente. Bastava ver as gargalhadas para ver que a apreensão era imediata. Isto é, não só porque os autores sabiam escrever muito bem, ( ) sempre com com uma segunda intenção, mas os atores também, porque os ato os atores também sabiam salientar a segunda intenção a Aí, e a questão da malícia, da maneira de falar, e o gesto, é claro que é gesto, tal de corpo e tal, então você pode dizer, com a mímica, muita coisa você num vo você não diz com a palavra. Então, realmente, no teatro de revista, ãh aí havia uma liberdade muito grande, mas não é exatamente o tipo, por exemplo, do da peça do do Oswald de Andrade, porque o próprio teatro de revista, ele aceitava muito bem as regras do jogo, como como também a censura aceitava. Ha Havia umas certas regras (tosse) do jogo e essa, dentro disso, ele podia dizer o que quisesse. Aliás, o próprio teatro, ãh por exemplo, de ( ), poderia também ser muito malicioso. Não era um teatro ingênuo. Mas a censura se preocupava muito com palavras. Porque a palavra que é chocante, as coisas não. Depende da maneira como a gente diz as coisas. Então tudo se pode dizer. Mas não se pode dizer de qualquer maneira. Me parece que a diferença é muito grande com o outr De lá para cá foi essa. Hoje em dia há mais ÃH franqueza, há mais liberdade, há menos hipocrisia. Naquela época não, as coisas eram ditas subentendidas.

SPEAKER 1: : não é ###