Inquérito SP_EF_154

SPEAKER 1: : Eu tive a ocasião de dizer, numa das primeiras aulas desse curso, que a minha função como coordenador do curso é uma função de tapa-buraco. Como diretor substituto em exercício do Instituto de Estudos Brasileiros, eu não deveria me indicar para coordenar um curso dessa importância. Eu fiz isso, quero falar em em defesa dessa minha posição, premido pelas circunstâncias.  Aconteceu que, na oportunidade em que devíamos começar os cursos o curso, os professores, membros do nosso conselho, uns estavam em férias, outros estavam preparando material para defesa em em concurso,  outros por outros motivos de doenças, et cetera, não puderam aceitar o convite que eu lhes fiz Nessas condições, como o professor Orlando Barth, me reclamava sempre a indicação do coordenador, e eu, obediente a suas ordens. Não, ordens não, pedidos (riso).  Eh fazia questão de realizar o curso, porque acho que o curso pode ser de grande interesse para todos nós, Uma vez que estamos estudando as décadas, as últimas décadas, eh as as primeiras décadas depois de vinte, porque em vinte is se iniciou um grande movimento renovador da nossa cultura, e nós íamos fazer agora o o segundo curso, da segunda década.  Isso me parecia muito importante. Eu não podia deixar de realizar o curso,  E como não tinha coordenador, acabei aceitando essa incumbência.  Realmente eu estou fazendo aqui uma defesa dessa minha auto indicação.  Mas a minha posição de tapa-buraco não acabou com isso.  Convidei para falar sobre arquitetura dois nomes ilustres.  Professor Eduardo Corona, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, que falará sobre arquitetura, de uma maneira geral, na década de tr inta. Eu eu fazia questão de que, nesta oportunidade, tivéssemos contássemos com a presença do homem que foi o grande revolucionário da década de trinta, porque ele fez a mudança do ensino e fez a revolução no ensino. Até então, nós aprendíamos arquitetura à maneira acadêmica.  E, de repente, no Rio de Janeiro, um professor, diretor da Escola Nacional de Belas Artes, virou a página e passou a ensinar arquitetura, como nós a entendemos hoje, a maneira moderna.  Todos vocês já sabem que eu estou falando de Lúcio Costa. Lúcio Costa Nós consideramos o papa da arquitetura contemporânea.  É um homem que renovou tudo.  Foi, como eu, um projetista de neocolonial.  Mas um dia percebeu que devia que a arquitetura só pode ser autêntica quando ela é atual e pôs de lado essa arquitetura antiga e passou a a dirigir o movimento da renovação da nossa arquitetura.  mas Lúcio é um homem de muitos compromissos e como eu sabia da sua dificuldade de vir a São Paulo para dar uma aula fui eh pessoalmente ao Rio levar um convite para que ele viesse fazer aqui o seu depoimento que seria de uma importância extraordinária para vocês todos que estudam cultura brasileira e para nós arquitetos em especial mas eu sabia que dificilmente ia conseguir trazer Lúcio Costa   E isso aconteceu. Lúcio me disse logo de início que não poderia vir, que ele não tinha condições de vir aqui fazer essa palestra.  E que havia feito uma uma um trabalho para um dos jornais do Rio, em que ele contava mais ou menos aquilo que nós estávamos pedindo que ele contasse aqui. E se escusou do convite. De passagem, Eu vou contar também que fiz um outro convite que eu gostaria muito que tivesse sido aceito, mas que nas mesmas condições do Lúcio eu sabia que não dificilmente conseguiria mas e que fui pessoalmente também ao Rio convidá-lo. Carlos Drummond de Andrade. Eu sei que se trouxesse o Carlos seria um um sucesso muito grande. Também Carlos Drummond de Andrade eh escusou-se com razões mais ou menos parecidas com as do Lúcio.  Então, o Lúcio Costa, ãh conversando comigo, indicou dois nomes de arquitetos que poderiam fazer depoimento sobre o movimento de arquitetura renovadora no Rio de Janeiro.  Um era Jorge Moreira e outro Carlos Leão.  Esses dois arquitetos participaram da equipe que projetou Ministério da Educação e Saúde naquele tempo, hoje Educação e Cultura, que passou a ser um marco da arquite con arquitetura contemporânea brasileira e mundial.  Não só brasileira, mas também mundial. Jorge Moreira aceitou o convite e eu estava certo de que ele viria e vocês todos viram no programa o nome de Jorge Moreira.  Entretanto, Há dois ou três dias, depois de iniciado o curso, Jorge Moreira (tosse), por intermédio de um irmão seu, que vive aqui em São Paulo, nos comunicou da impossibilidade de vir, porque ele perdera um outro irmão nesses dias e não se sentia em condições de vir aqui fazer um um depoimento.  Está aí porque que eu estou aqui.  Tapa-buraco, como já vinha fazendo antes. Com a impossibilidade de Jorge Moreira comparecer, eu não faria a indelicadeza de convidar outro arquiteto ilustre, na véspera da palestra, para que vir aqui falar.  E fui forçado, portanto, a vir aqui impingir a vocês alguma coisa da minha experiência na década de  Realmente, eu sou fruto da década de trinta  O professor Orlando já disse que eu me formei em trinta e  e um. Eu me formei exatamente no ano (tosse) em que Lúcio Costa foi nomeado diretor da Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, e que iniciou este grande movimento de transformação, de renovação da nossa arquitetura.  No Rio iniciava-se, então, um novo esse movimento de renovação.  É curioso aqui constatar o seguinte.  A arquitetura contemporânea despontou aqui em São Paulo.  Gregório Pachaves, que chegou da Rússia, em vinte e cinco, publicou um manifesto acerca da arquitetura moderna, em que ele propunha uma renovação total da nossa arquitetura. N ovecentos e vinte em Odessa e depois com cursos de pós-graduação em Roma, ele vinha com ideias novas de arquitetura e aqui encontrou aquele carnaval de estilos que era característico da época. () Não se conformando com isso, publicou este artigo em que ele propunha uma limpeza geral de fachadas e uma nova conceitu conceituação da arquitetura de acordo  com a maneira de pensar do nosso tempo, abolindo totalmente na cópia arquitetônica. Em mil novecentos e vinte se te, Wachowski, aqui em São Paulo, iniciou a construção da su da primeira casa modernista do Brasil, na rua Santa Cruz, a casa em que ele viveu durante muitos anos e que está lá até hoje e que, se Deus quiser, os nossos patrimônios históricos  ão de tombá-la, registrando no livro do Tombo, porque é um monumento histórico que precisa ser preservado. (tosse) No mesmo ano que Lúcio Costa, que que Wackowski fez esse manifesto, um outro arquiteto paulista, Rino Levi, escrevia uma carta de Roma, onde ele estava estudando (tosse), propondo também a renovação arquitetônica,  em moldes de acordo com a nossa cultura, com a nossa época.  Um terceiro arquiteto paulista também, em mil novecentos e vinte e sete, no mesmo ano em que Lúcio Co e que em que o o Warchavchik iniciou a construção da sua casa, apresentava a um concurso para o o Palácio de Governo do Estado de São Paulo, um projeto inteiramente revolucionário, moderníssimo.  Flávio de Carvalho. E ainda há outros exemplos de arquitetos de São Paulo que despontavam já com a nova arquitetura, com essa renovação arquitetônica antes de trinta e um.  Mas todos estes exemplos foram exemplos esporádicos  que se realizaram aqui, que explodiram aqui, que fizeram escândalo aqui, mas o ensino em (tosse) São Paulo continuava o mesmo, ensino acadêmico.  me formei neste ensino acadêmico. Então no mesmo ano em que Lúcio Costa êh abria as portas para uma nova para um novo ensino de arquitetura no Rio de Janeiro, eu saía do curso de arquitetura da escola de engenharia Mackenzie.  Não era uma faculdade de arquitetura, era um curso de arquitetura.  Quando o professor Fernando Azevedo falou nos diversos profissionais que estavam sendo formados pela universidade e não falou nos arquitetos, eu lhe dei uma cutucada para que ele falasse aos arquitetos, ãh apenas para que o nome arquiteto fosse citado também naquela relação.   mas realmente nós estudávamos em cursos de arquitetura.  Não existia faculdade de arquitetura em São Paulo. Só na década de quarenta, no fim da década de quarenta, que essas faculdades apareceram.  O curso de arquitetura, então, da Escola de Engenharia Mackenzie, eh tinha dois anos em comum com com os engenheiros civis.  Os dois primeiros anos nós sentávamos lado a lado com os estudantes de engenharia.  E no terceiro ano é que nós passávamos para o curso de arquitetura.  Eram dois, três, quatro, a minha turma foi a maior de todas até então, tinha cinco alunos.  E a outra escola, o outro curso de de arquitetura que existia em São Paulo era o da escola politécnica  tinha sempre um pouco menos, dois, três alunos por ano. No Durante o primeiro ano, nós fazíamos nesse curso de arquitetura, primeiro ano do curso de arquitetura, nós desenhávamos as ordens clássicas, coríntia, dórica, jônica, compósita, etcé  Mas não desenhávamos simplesmente um desenhinho à mão livre, bonitinho não. Nós fazíamos isso em aguada de nanquim.  Primeiro a gente tinha que colar um papel () de primeira qualidade na mesa e aquilo já era uma arte. Colava com papel molhado, esticava, esticava.  Quando parecia um tambor de tão esticado é que a gente começava o desenho.  Então desenhava-se uma coluna  Respeitando rigorosamente as determinações de vinhola, com todas aquelas proporções, todos aqueles detalhes.  Desenhava-se a sombra projetada da coluna. E depois, então, vinha a parte mais difícil, a aguada de nanquim.  Hoje não se faz mais isso A aguada de nanquim, a gente dissolvia pedra de nanquim.  Levava horas e horas esfregando aquela pedra para dissolver.  E depois, então, ia dando o banho na no papel, de cima para baixo, com o nanquim bem preto lá em cima, e depois vinha clareando, clareando, clareando, como aqueles anúncios de da televisão que a gente ouve toda hora.   Como total, coisa desse tipo Então, chegava lá embaixo, uh uh o nanquim estava quase diluído, e não podia ter nenhuma mancha.  Qualquer mancha era preciso refazer tudo.  porque uh o nanquim num não admite retoque. Então nós passávamos um (tosse) ano inteirinho desenhando estas ordens.  Cada desenho daqueles era um um trabalho insano.  Fim do primeiro ano do curso, os dois ou três seguintes, porque houve tempo que o curso era de seis anos, outras vezes era de de cinco os os  Os anos seguintes, então nós projetávamos um pavilhão romano, um hospital gótico (risos), um Belvedere Luís dezesseis, ou simplesmente uma ala de um hospital.  Então, nós gastamos todo o nosso curso com esse tipo de estudo. tem seu lado positivo, realmente. Primeiro que a gente aprende aquilo tudo, aqueles estilos todos, a gente passa a conhecer.  E cultura não nasce de estalo.  A gente, para conhecer as coisas, precisa saber de onde elas vieram e como chegaram a nós.  Então a gente aprendia, realmente, a arquitetura do passado.  Hoje há uma tendência de apagar o que passou e começar tudo de novo.  É um erro () Toda a cultura nossa tem que ter base naquilo que outros já fizeram. Mas nós fazíamos só isso, porque era proibido projetar em arquitetura moderna.  Os exames finais do curso foram, me do meu curso, foram em dezembro de mil novecentos e trinta e um, exatamente no início da década que nós estamos estudando. éh  No Mackenzie, Além do curso e dos exames finais, nós tínhamos que fazer tese e defender tese. Quando eu acabei o curso, em trinta e um em dezembro, eu estava aflito para me casar, já estava noivo há dois anos.  E não esperei muito não, casei imediatamente.  E depois de casado, com aliança no dedo, eu voltei para a escola.  Aquela aliança brilhava e eu mostrava para todo mundo com muito ouvi Voltei para a escola para defender tese. Então, a minha formatura mesmo, o dia em que eu pude pôr o um outro anel com uma pedra azul bonita no dedo e receber um um diploma desse tamanho, foi lá para março de trinta e dois.  Assim que me formei, já era casado, um homem de responsabilidade, um profissional diplomado, saí à procura de emprego.  Fiz uma análise dos escritórios que estavam trabalhando em São Paulo e constatei que, para o meu gosto, havia dois que me serviam e que estavam com muito trabalho.  Um deles era Luiz Espinheira e o outro Alfredo Ernesto Becker.  Esses dois senhores eram concunhados, tinham sido sócios já.  Então parece que havia uma certa semelhança, uma perç uma certa ligação entre a arquitet na arquitetura que os dois faziam.  Eu não perdi tempo, fui ao esc ao escritório de Luiz Espinheira, que era na Praça do Patriarca, em cima daquele prédio onde está hoje a Casa São Nicolau, e me apresentei ao senhor. Luiz Espinheira, que eu nunca tinha visto. Contei umas prosas, eu estava na época que a gente conta prosa, e... Ele conversou comigo, me fez umas perguntas e me disse, só volte aqui daqui a semana que vem. Vamos ver. Mas no dia seguinte, ele teve a surpresa de me ver entrar no escritório dele de novo. Eu disse, doutor Espinheira, eu vim aqui para trabalhar. Eu vou ficar trabalhando aqui. E fiquei. Eu acho que ele gostou da minha decisão e no fim do mês me pagou quinhentos cruzeiros. E eu fiquei trabalhando com ele. Mas esse foi um ano que todos nós em São Paulo passamos por grandes dificuldades. Em nove de julho estourou a Revolução Constitucionalista. E eu, com os meus poucos anos, com a minha vitalidade, não esperei muito quando César Ladeira, eh pelo rádio, convocava os paulistas a trabalharem pela Revolução de São Paulo. Eu fiquei logo à frente para me entregar, para para mim partir para a frente então. Mas o o Quartel-General de São estava da Revolução, pedia a todos aqueles que tivessem um automóvel qualquer para levar o automóvel. E eu tinha um fordezinho daqueles de bigode, a gente acelerava numa mão, eu tinha um controlador de faísca do outro. E eu corri então ao quar ao Quartel-General na rua Conselheiro Cuspinia e me (tosse) apresentei e apresentei o meu fordeco. Eu assisti ali algumas cenas engraçadas. Ah eu vi, por exemplo, um senhor muito bem posto, muito bem vestido, com uma gravata bonita, italiana, provavelmente, oferecendo um seu Cadillac. Então, o o capitão que estava ali tomando nota perguntou a ele, que ano é? Não me lembro, mas devia ser de uns dez anos atrás. Em que condições está? Bom, ele está em cima de de cavalete, Há uns dois anos. E tem bons pneumáticos? Não, ele está sem pneumáticos. (riso) E o motor? Bom, o motor eu não sei, porque há muito tempo que ele não funciona. (riso) Enfim, o o carro, ele ele não tinha onde jogar fora aquele carro, ele levou para oferecer à Revolução. Evidentemente foi rejeitado. Mas o meu oferecimento, ao contrário, foi aceito imediatamente. O capitão leu lá a minha ficha e me disse, o senhor tem uma missão para o senhor hoje. Nós vamos montar um um quart um hospital de campanha em Cruzeiro. E o senhor me faz o favor de ir ao Cambuci. Eu não me lembro se era um hospital ou se era um quartel militar. Se era um hospital militar ou um quartel. Vai buscar lá um um tenente farmacêutico e depois o senhor passa na Avenida Angélica, na casa do professor Ayres Neto, que vai ser o diretor do nosso hospital de campanha. Eu fui ao ao Cambuci e apresentou-se para o meu primeiro passageiro o Tenente Farmacêutico Porfírio da Paz. (riso) Fui com ele à casa do profero professor Ayres Neto e durante a noite nós viajamos até Cruzeiro para instalar lá o primeiro hospital de campanha da Revolução Constitucionalista de. em Cruzeiro eu assisti já os primeiros bombardeios o avião do governo chamava-se... nós chamávamos de vermelhinho e o vermelhinho passava e a gente via o vermelhinho e de repente a gente via sair um negocinho assim balançando era uma bomba que vinha (riso) então a gente abria assim o negócio caía e fazia... Puff! (riso) eram (riso) as bombas da revolução eram as maiores que havia naquele tempo, não é que elas fossem... Imagine se a gente pudesse fazer isso com as bombas atômicas de hoje. Bom, eu voltei para São Paulo, me apresentei novamente ao quartel-general e o capitão me disse, agora o senhor vai se fixar em Mogi das Cruzes. Temos lá um posto de abastecimento e as tropas passam por Mogi e o senhor tem que abastecê-las lá. E lá fui eu para Mogi, e me deram um posto de gasolina na saída da estrada, depois que a gente atravessa a estrada de ferro, há um posto lá, e lá fui eu tomar conta daquele posto daquele posto. E todo mundo que ia para a revolução passava por mim. E eu lá, pondo gasolina, dando informações, prendendo ladrão de vez em quando na cidade, porque eu passei a ser autoridade de Mogi das Cruzes, apenas com uma uma fita amarela no braço, um revólver na cintura, que eu nunca tinha dado um tiro, (riso) eu era autoridade. E e eu fui ficando ali, mais ou menos, apodrecendo, porque eu já estava com vergonha. Todo aquele pessoal herói passava, ia para frente, e eu ali atrás, na retaguarda, pondo gasolina no carro dos outros. (riso) Em Mogi, assisti algumas coisas engraçadas. Durante a Revolução de trinta e dois, essas coisas fogem um pouco o assunto da de arquitetura, mas é o retrato da década, né? Na Revolução de Todo sujeito válido, homem, e quase todas as mulheres trabalharam pela Revolução. Ninguém ficava em casa ou ninguém saia na rua sem uma fita no braço ou sem uma farda. E, como era todo mundo andava de bonde, quando o bonde estava cheio, a gente ia pendurado no estribo. Então, quando avistavam () no estribo, sem fita no braço e sem farda, uma senhora se levantava e oferecia lugar. Isso acontecia todo dia. (tosse) Em Mogi aconteceu mais engraçado ainda. Uma noite eu fui chamado à praça principal, ali junto à estação. Havia uma correria, uma gritaria, um fuzuê danado. E eu fui lá ver o que era autoridade. Então o caso foi o seguinte. As moças ofereceram uma festa para dois rapazes da cidade. E foi todo mundo para a praça. E elas, cada uma, tinha um um presente para dar para cada um dos rapazes. E todo mundo em volta, dando mais discurso, uma porção de coisas. (tosse) E afinal, entregaram os presentes e os rapazes tiveram que abrir as caixas em público. Era um sutiã para cada um. (riso) Porque eles não estavam participando da Revolução. Eu fui ficando tão envergonhado que um dia eu vim a São Paulo, fui ao quartel-general e disse, olha, vocês fiquem com aquele posto porque eu não vou mais para lá. Aquilo é retaguarda, eu quero ir lá para frente. E eles puseram então um substituto e e, por coincidência, era o Martins, da editora. Foi o meu substituto (riso) no posto de Mogi das Cruzes. Foi quando eu o conheci. Então, o Instituto de Engenharia de São Paulo estava organizando o que eles chamavam de Delegacia Técnica de todas as cidades, todos os municípios do interior. E me puseram então numa delegacia de Apiaí. Apiaí já tinha sido tomado pelas pelas tropas do governo. E eu, e o hum ãh Major McKnight, era um um senhor alto engenheiro que era o o delegado técnico e eu era o seu substituto. E as ordens eram de que nos apresentássemos ao General Taborda em Itapetininga. E lá fomos nós para Itapetininga e ficamos sob as ordens do General Taborda. E nunca fomos a Apiaí porque Apiaí daí para diante nunca mais voltou para para para a Revolução de São Paulo. Já já estava em mãos das tropas do governo e nós nunca chegávamos até lá. Mas participávamos de muita coisa, abrimos estradas e e participamos da Revolução. Até que um dia recebemos uma notícia de que a guerra a guerra tinha acabado, nós tínhamos sido derrotados. Então voltamos para São Paulo de cabeça baixa, com pena de termos perdido aquela Revolução tão bonita, um esforço cívico como nunca se fez no Brasil, E que eu creio que nunca mais se fará, porque o entusiasmo era generalizado e total. E, o que fazer? Voltamos para São Paulo. E eu, de cabeça baixa sempre, voltei ao escritório de Luiz Espinheira. Ele me aceitou e eu lá fiquei trabalhando algum tempo. Até que um dia (tosse) recebi a primeira encomenda de serviço. Ah eu fiquei felicíssimo. Me chamaram para fazer uma calçada na Avenida São João. Os ladrilhos tinham se soltado e me contrataram então para refazer a calçada. O serviço tinha que ser feito de noite e eu pus a turma lá fazendo o trabalho, depois de comprar os ladrilhos. E eu ia de noite com a minha senhora para assistir a minha obra, fiscalizar o serviço. E foi uma felicidade aquele dia. Mas tudo tem seu preço. Dois dias depois eu fui chamado à obra de novo. Durante o dia, no dia seguinte, o povo pisou naqueles ladrilhos e soltou tudo.  Eu tive então que refazer, com o devido prejuízo, a prime o limero s primeiro serviço que eu fiz foi aquela calçada de São João.  Mais adiante, contratei um projeto e uma construção.  Uma casinha térrea, pequenininha, na Vi em Vila Mariana, na rua Floresta.  Casinha p simplesinha, telhado de duas águas,  Aquilo foi uma festa para mim.  Minha senhora já tinha tido um bebezinho, minha filha Norma, que hoje é mãe de uma de uma filha casada que já está aqui.  E a Norma foi na col no Colo de Vilma à festa da Cumeeira, na obra da na minha grande obra da rua floresta.  Eu estou contando isso porque  A minha família, a minha esposa e o meu pessoal todo sempre me acompanhou muito de perto na nas minhas atividades profissionais.  Bom, tendo contratado uma obra, não tinha mais sentido eu continuar empregado de um outro escritório.  Então, pedi para sair e montei um escritoriozinho na Praça Ramos de Azevedo, num prédio  onde há um banco hoje, esquina da Rua Barão de Itapetininga.  Aluguei uma salinha que tinha quatro por se eis, quatro por cinco. Então fiz a primeira mágica arquitetônica Pus uma parede que dividia um pedaço para ser o o meu escritório, propriamente dito.  E a outra metade eu pus uma estante de livros que fazia fundo para a entrada, onde havia um banco corrido, era a salinha de entrada, sala de espera E do outro lado, a sala de desenho,  com um estante de livros ih e a minha prancheta.  E era eu sozinho que trabalhava nas três salas.  Atendia numa, depois conversava na outra e depois ia de desenhar na terceira.  Aí comecei a pegar uma casinha e outra como arquiteto, construtor e eclético.  Eu era engenheiro-arquiteto, vocês se lembram disso.  O meu diploma, como dava o Mackenzie naquele tempo, era de engenheiro-arquiteto.  Bom, isso se explica.  O arquiteto naquele tempo era mestre de obra.  Quando a gente alguém falava, ah o fulano é arquiteto, ah é... Era mestre de obra, era um era um pedreiro um pouquinho mais sabido. Então depois nós fizemos uma campanha muito grande para valorizar a profissão do arquiteto e fazemos até hoje.  Quando alguém me chama de engenheiro, eu digo um uma coisa feia. (risos) Não porque eu desrespeite ou menospreze os engenheiros, ao contrário, eu trabalho  com eles todos os dias e todas as horas.  Mas se me chamarem também de Presidente da República, eu protesto, porque eu sou arquiteto e não Presidente da República.  Então, montei esse escritorinho e comecei a esperar freguês.  Eu já tinha uma casinha, achei que deviam aparecer outros.  Eu esqueci de dizer que na nessa casinha, que de o terreno de frente tinha seis metros, tinha uma placa com o meu nome que devia ter sete ou oito.  dois de altura e o meu nome em letras garrafais e embaixo escrito com todas as letras engenheiro, arquiteto aí eu comecei a pegar uma casinha e outra e quando o sujeito entrava no meu escritório eu perguntava logo de cara que estilo o senhor prefere estilo?  o sujeito dizia, bom eu tenho um irmão que tem uma casa normanda você faz normando, faço vinha outro queria colonial não sei o que às vezes eu não sabia nem o que era  Então eu fazia como aquela mãe que o pequeno estava lendo um livro qualquer e perguntou, como é que é?  Enciclopédia, enciclopédia. E a mãe disse, sai menino, trabalha aí e não atrapalha, eu estou lendo aqui, você está aí.  Ela não sabia também, deu uma bronca no g no garoto.  Foi para o quarto, pegou o dicionário e voltou, como é que você não sabe o que é enciclopédia?  Estabecou a enciclopédia em cima do menino. Eu também fazia o mesmo. Quando eu não conhecia um estilo, eu dizia que conhecia, aí enrolava o sujeito e ia para casa e procurava revistas e livros e até achar alguma coisa que se parecesse com aquele estilo que o sujeito queria.  E nunca se saiu ninguém sem receber a casa do estilo que queria.  Numa ocasião, era costume nessa nesse tempo, nós fazermos exposição das casas concluídas.  Então eu me vangloriei aí, eu dei uma esnobada daquelas.  Eu pus em exposição, na mesma época, três casas.  Uma no Pacaembu, estilo colonial, com decoração marajoara. (risos) Uma outra na Rua Pamplona, (tosse) colonial mexicano.  E uma terceira no Jardim Paulista, moderna.  Porque o moderno, para mim, era um estilo como os outros. Como eu era () um eclético, eu podia fazer mexicano, colonial brasileiro ou moderno.  Como um dos estilos que do ecletismo que eu era capaz de fazer.  Então, eu também fazia moderno. E nesta nessa vez, eu esnobei mostrando três casa  Toda a minha capacidade eclética com três casas expostas ao mesmo tempo em três estilos diferentes.  Assim eu continuei fazendo estilos.  ### ### E fiz inúmeras casas, como eu disse, em todos os estilos que fossem aparecendo.  ### Um indivíduo, jornalista, editor, me procurou, queria fazer um livro das minhas obras.  con Concordei, ele começou a trabalhar, foi reunindo o material, fotografando as obras, e ele fez o livro.  Construções Residenciais do Engenheiro Arquiteto Eduardo Izabel.  esta Este livro tem casas de todos os estilos e eu fiz questão de mostrar bem a variedade de estilos que eu era capaz de fazer.  Mas estes esse livro esgotou-se depressa, porque eh isto não era da época, isto ainda é hoje.  Há indivíduos que ainda fazem ecletismo e têm uma freguesia louca.  De vez em quando vem uma onda de  estilo neocolonial, ou qualquer outra coisa, rústico, não sei o quê, e essa gente têm serviço que não é brinquedo, porque ainda, erradamente, o nosso público tem uma certa tendência para para esses estilos. Eu comparo esta invasão de estilos que nós sofremos, e que ainda mantemos hoje, com o que se faz no carnaval. Aqueles famosos costureiros do Rio de Janeiro fazem como eu fazia. o sujeito entra na no no ateliê... Como é que se chama aquele famoso costureiro? Esses famosos costureiros do Rio, não precisa citar nomes. o sujeito entra e diz quero uma fantasia. diz que fantasia você quer. Napoleão... uh... uh... Aquilo do cangaço, não é? O rei do cangaço. Lampião, Napoleão, Lampião, ou um soldado de do império, o que o sujeito quiser ele faz. Se for mulher, vem com ah Cleópatra, ou a Rainha de Sabá, ou Maria Antonieta, e o o costureiro faz tudo. O estilo que a pessoa quiser, ele faz. Inclusive, se veste também para o desfile no municipal com com uma fantasia de qualquer Estilo do passado. Era o que eu fazia também. Eu vestia as minhas casas com a roupa que o sujeito quisesse. Do estilo que ele quisesse, da época que ele quisesse, do povo que ele quisesse. Então em mil novecentos e trinta e sete, saiu este livro. Para confronto, em mil novecentos e autorizava Lúcio Costa e a sua grande equipe a fazer o projeto do Ministério da Educação e Saúde. O edifício que passou a ser modelo, passou a ser marco da nossa arquitetura moderna e que é até hoje considerado e lembrado como um arquitetura perfeita da nossa época, uma representativa, uma um exemplo representativo da da arqui arquitetura da nossa época.  Esse edifício foi iniciado no mesmo ano em que eu lançava o meu livreto carnavalesco.  No mesmo ano em que esse livro apareceu, aqui em São Paulo, os arquitetos Álvaro Vital Brasil e e Adhemar Marinho iniciavam a construção do edifício esther na Praça da República, esquina da Rua sete de Abril.  Outro modelo da arquitetura contemporânea brasileira, na da época especialmente, com grandes renovações.  oi Inovações. Por exemplo, as lajes dos andares eram livres, não tinham paredes de tijolo.  E as divisões podiam ser móveis, podiam ser mudadas. Eram painéis que faziam as divisões dos diversos cômodos. Então, você podia ter um escritório muito grande e fazer depois uma porção de salas pequenas. Ou, se tinha salas pequenas, podia derrubar as paredes e fazer grandes salões. Era uma renovação total. Esse edifício está ainda hoje na Praça da República, ainda é bonito, embora tenham sido sido substituídas com umas placas pretas de vitrolite que ele tinha na fachada e que, algumas tendo caído, na calçada, em cima da marquise, ãh ãh as placas foram substituídas por por uma reboco, que não é nem preto, nem cinza, nem nada, muito feio, o que prejudicou bastante a beleza do edifício. Mas o edifício ainda está lá. E foi projetado na mesma época, na mesmo ano em que eu eu lançava o livro Construções Residenciais do Engenheiro Arquiteto. Então vocês veem que este meu depoimento muito mais do que depoimento, é uma confissão de culpa () este grupo que fez este livro frequentava o meu escritório diariamente para colher os elementos para o livro e eu procurei meter na cabeça do Corrêa de Brito, que era o chefe da equipe, de criar uma revista de arquitetura Fazia muita falta uma revista de arquitetura aqui em São Paulo. E tanto eu martelei na cabeça dele, era um sujeito muito cacete e persistente, que surgiu a ideia e ele criou a revista Acrópole. Esta revista nasceu no meu escritório () Eu que escolhi o motivo da capa, que era o monumento de Ramos de Azevedo, Eu que escrevi um artigo sobre a Acrópole de Atenas, para justificar o nome da revista. Publiquei a primeira casa, a casa colonial do professor Teotoro Braga, que era um grande estudioso da, do Marajoara (tosse) E a casa é toda decorada com desenhos marajoaras, a começar por estes ferros todos, por essas grades das janelas. E daí por diante, eu que fazia os contatos com os colegas para publicassem pu publicassem artigos e as projetos de suas casas. E a revista, são detalhes que eu desenhei no meu tempo de ecleticismo. E a revista Acrópole viveu até poucos anos, um ou dois anos, quando se extinguiu. Foi uma pena porque ela nos alimentou com informações, às vezes erradas, como aquelas que eu dava no princípio, mas sempre nós tínhamos uma uma revista especializada, onde nós publicávamos artigos e os nossos projetos. Foi uma pena que tivesse acabado. Em janeiro de mil novecentos e quarenta, eu estou extravasando um pouquinho o meu campo, mas eu quero justificar a minha posição. Eu estava no meu escritório, atendendo aos empreiteiros e aos empregueiros das minhas construções, quando me telefonou o Zico. O Zico é um sujeito que já passou para o folclore brasileiro, porque ele é é um é um homem que tem uma participação extraordinária, no Instituto de Engenharia de São Paulo. Ele é secretário do Instituto, secretário perpétuo do Instituto. Ele faz parte, integrante do Instituto. E naquele tempo ele já era secretário. Me telefonou, eu era sócio do Instituto de Engenharia, eu era engenheiro arquiteto. E o Zico me telefonou e me disse, eu precisamos que o senhor venha aqui imediatamente. Está aqui conosco um grupo de arquitetos do Rio de Janeiro e nós vamos fazer uma recepção a eles. Então, o senhor, como um um dos nossos poucos arquitetos, convidamos para que venha até cá. E lá fui eu para o Instituto de Engenharia e conheci eh Nestor Figueiredo, ãh Marcelo Roberto, Vladimir Alves de Souza, Paulo Candiota, Rafael Galvão, João Cair, que era recém-formado, um grupo grande de arquitetos.  Esses arquitetos saíram do Rio de Janeiro de navio, e iam para Buenos Aires para o quinto Congresso Pan-americano de Arquitetos. O navio parou em Santos, eles subiram a serra de trem, naturalmente, e foram recebidos no Instituto de Engenharia. E lá fui eu para conhecer esses colegas e fazer contato e tomar um aperitivo com eles. Eu gostei imensamente da turma, realmente uma turma simpaticíssima, e fiquei entusiasmado com a ideia de participar de um Congresso Pan-americano de Arquitetos. Eu não saía nunca do meu arq do meu escritório, e nem sequer conhecia os meus companheiros de profissão aqui de São Paulo, a não ser aqueles que eram meus colegas do Mackenzie, os outros eu não conhecia. Então, uma possibilidade é eu conhecer esse grupo melhor do Rio e todos os arquitetos pan-americanos que participassem do Congresso. Eles embarcaram de navio para Buenos Aire para para Buenos Aires primeiro e eu cheguei em casa e disse para Vilma vamos a Montevidéu e Vilma nunca deixou de topar a parada dois dias depois embarquei eu com uma poção de fotografias desse tamanho de obras de todos os estilos e fui pegar o pessoal de avião em Buenos Aires ainda passamos dois dias juntos onde fizemos uma grande camaradagem e dali seguimos para Montevidéu. Em Montevidéu, o congresso foi um sucesso. Havia representantes de todos os países da América, desde os Estados Unidos, Canadá, de todos os países da América Latina. E lá estava eu, no meio daquela gente ilustre toda, como um engenheiro-arquiteto. Aí, no primeiro dia, eu já pensei, que besteira essa história de engenheiro-arquiteto. Eu sou é arquiteto, nada de engenheiro. Eu não tenho nada de engenheiro, eu não sou calculista. A matemática é um negócio que eu faço por obrigação, não me agrada. E eu gosto mesmo é da arquitetura. Por que eu vou ir de ser engenheiro? Ninguém mais usa eng esse título, todos esses que estão aqui. Então logo lá eu risquei uh o título e fiquei só com arquiteto. Mas começou então a minha transformação. Parece que foi uma pedra de toque. Tudo que nós conversávamos ali era sobre arquitetura contemporânea. Nunca ninguém citou qualquer outro estilo. Então eu descobri, comecei a descobrir que estilo é um troço que a gente faz sem saber. Quando a gente tá querendo fazer estilo, a gente tá fazendo bobagem. O estilo nasce porque depois que a gente vai e que uma porção de gente fez alguma coisa em arquitetura que tem traços comuns, Os outros do futuro vão dar um nome de estilo para aquele conjunto, porque é uma poção de coisas que estabelecem um um traço comum para aquela arquitetura. Então aquilo é um estilo. Assim se fez com a arquitetura de Roma, de, de Atenas, uh, com o Gótico e todos os outros. Mas ninguém nunca pensou, a não ser depois, em fazer uma coisa para fazer estilo. Eles estavam simplesmente fazendo arquitetura. Usando arquitetura como se deve usar, resultava uma arquitetura nova. e assim foram-se () evoluindo a arquitetura Nesse congresso, discutia-se, era o tema do congresso, a casa da classe média. Aí eu briguei, foi uma barbaridade. Eu dizia a eles, o que nos interessa estudar agora, já, neste começo de discussão, a classe média? Vamos estudar os problemas da casa popular, Porque se nós resolvemos do popular, o sujeito aos pouquinhos vai melhorando a sua casa, ele vai fazendo classe média, classe alta, granfino e tudo mais. Aí é uma questão de dinheiro. Nós temos que dar condições mínimas para o sujeito morar. E depois cada um aumenta a sua conforme pode. E briguei desesperadamente por isso. Muitos anos depois eu encontrei no Rio de Janeiro um argentino que tinha sido o presidente da minha comissão. E esse sujeito, nós fizemos uma recepção a ele no Rio, e conversamos muito, lembrando o congresso. então ele me disse nuestra comisión tenía muchos comunistas y usted era un deles () me pôs o dedo no nariz, porque eu achava que arquitetura devia ser, começar pela casa popular, e não pela casa da classe mé dia, então eu dizia Mas escuta, na minha cidade tem um sujeito que é riquíssimo. É a maior fortuna de São Paulo. Nessa ocasião era o Matarazzo. Ele veio para o Brasil imigrante. Pobre. Não tinha nada. E foi indo, foi indo, foi indo e ficou rico. Hoje ele é... A expressão é moderna, mas vamos dizer o correspondente. Hoje ele é um grã-fino da classe alta. Então eu queria que você me dissesse em que dia ele passou da classe popular para a classe média. em que dia ele passou da classe média para essa classe mais alta Eu não vejo essa dis, diferença. Então também não posso classificar uma, uma casa que é da classe média ou da classe alta ou da classe baixa () Eu sei que nós podemos estabelecer um mínimo que é decente, é humano para um sujeito viver. Mas daí para cima é um problema de dinheiro. Cada um vai gastar o que puder e melhorar de acordo com as novas técnicas, os novos materiais e as condições de conforto que () época moderna nos oferece, este () meu, essa minha interpretação mereceu uh, o, vamos dizer agora o xingamento (tosse), porque a intenção era de xingar de comunista, porque era um sujeito que defendia a classe pobre mas como né um arquiteto () Então eu quero dar uma explicação a vocês. Realmente na arquitetura do passado, o que se fazia como arquitetura eram os palácios e as catedrais O resto não tinha importância. Mas houve um movimento renovador da nossa época, de que era um dos líderes Walter Gropius, que passou a fazer a arquitetura da class da classe pobre. A cla A casa popular hoje é o o tema mais importante para o arquiteto. É muito mais difícil fazer uma boa casa popular do que um palácio qualquer. Porque depois a coisa, com dinheiro, a gente vai enriquecendo, novos materiais, novas novos confortos, novas coisas, e tudo é fácil. Agora, a casa popular, como nós entendemos hoje, é que é o grande problema. Não a casa em si, uma casinha de tijolo com telhadinho de () ou de de ou de tijo Habitação popular. Não habitação popular como muita gente entende por aí, essa casinha sozinha, mas habitação popular como um conjunto. Porque se a casa do índio é uma oca simples, em que é colocada em volta de uma praça que é a Ocara, e j com outras ocas que todos juntos fazem a aldeia ahn indígena, a ca a casa do homem civilizado, quanto mais ele é civilizado, mais se complica, mais compli ãh complexa vai ficando. Então a habitação do homem moderno é um conjunto. E a casa em si passa a ser um dos elementos desse conjunto. A casa sem a escola não é habitação. Sem o o abastecimento não é habitação. Sem o acesso ao trabalho não é habitação. Sem o acesso a ao ao divertimento, aos centros culturais, à escola não é habitação. projetar a Casa Popular é projetar estes conjuntos populares. Isto é a verdadeira missão mais importante do arquiteto contemporâneo. Bom, eu estava então em Montevideo, aprendi que a arquitetura éh éh não é aquilo que eu estava fazendo e comecei a procurar interpretar a arquitetura com aqueles toques que eu tinha recebido daquela gente toda. Então eu vi um uma definição de um arquiteto romano, anterior a Cristo, e essa definição é válida até hoje para arquitetura. Arquitetura é a arte de construir com solidez, conforto e beleza. Então, solidez é uma coisa, é a construção. Os egípcios construíam com pedra. Os romanos e os gregos faziam com pedra. As colunas gregas perfeitas estavam situadas na no prédio a pequena distância, a pouco mais do que o di diâmetro da própria coluna, uma da outra, porque a verga em cima era limitada pelo tamanho da pedra que ia fechar o vão. Então não se podia fazer uma um vão maior, porque não tínhamos pedra para cobrir esse vão maior. Os romanos descobriram o arco, então começaram a separar mais as colunas. Toda aquela arquitetura era perfeita naquelas condições de trabalho, com aquele material que eles tinham. Quando foi modificando as condições de trabalho, quando chegou a idade média que apareceram as construç as arq as as catedrais góticas, havia aquela preocupação de levantar os prédios, de altear os prédios como que um caminho para Deus. descobriu-se que o arco podia ser cortado desde que ele tivesse um um outro arco escorando o empuxo lateral. Então, uma nova técnica surgiu, um novo sistema, uma nova arquitetura, uma nova beleza. Então, a a estrutura, que é aquele aquela resistência, da deste dessa fórmula de Vitrúvio foi evoluindo, até que chegou na na época moderna e nós fazemos com o concreto armado uma laje em balanço, sem apoio nenhum para um um estádio de futebol ou uma um jockey club. Não precisamos por coluna lá e nem poderíamos pôr, seria um desastre na frente de todo mundo. Então nós jogamos uma laje em balanço Como nós podemos fazer estilo do passado se nós temos condições tão diferentes de construção? Então, evoluiu o a resistência da definição de Vitrúvios, e evoluiu também a solução plástica. S Se o conforto de uma casa colonial para um () duro para dormir, uma mesazinha muito tosca, banheiro lá fora, cozinha lá fora e nada mais. E nós hoje temos colchão de espuma, colchão de pluma, temos ar-condicionado, temos água quente dentro de casa, água gelada e e e filtrada, temos eletricidade, temos rádio, temos televisão O conforto de hoje é totalmente diferente daquele conforto da casa colonial e muito diferente do conforto da casa romana, da casa grega, da casa dos dos egípcios antigos. Então o conforto evoluiu, a arquitetura tem que evoluir. Então aquele mesmo elemento da fórmula continua firme, só que a interpret a interpretação dele é diferente. O O conforto continua na fórmula, mas tem outro sentido. E E a beleza é a mesma coisa. S Se aquela colunata grega, com uma coluna, o espaço de duas colunas, igual ao diâmetro de cada coluna, era lindo, perfeito, naquele tempo, porque nós construímos todo aquele jeito. Ho Hoje nós podemos tirar as colunas todas. Então a nossa sensação de beleza tem que ser outra. Aí a A a beleza também evoluiu. Então, a mesma fórmula de Vitruvius, Solidez, conforto e beleza continuam a valer hoje, só que estes elementos trocaram de valor. E a arquitetura contemporânea tem que respeitar esta nova ahn esse novo essa nova valorização daqueles elementos e não seguir com os valores que os gregos e os os ter no e no tempo da colônia eram usados. Bom, e depois eu comecei a ler um sujeito chamado Le Corbusier, que num dos seus primeiros dias, quer dizer num dos meus primeiros livros já dizia a men mentira é intolerável a mentira é intolerável em tudo na vida da gente nós não admitimos que um homem minta não podemos admitir que um arquiteto minta e se um arquiteto está falseando a arquitetura está vestindo um prédio com uma roupagem de outra época se está copiando uma coisa que outros já fizeram mas que não tem nada que ver com a nessa nossa época ele está mentindo Então, quando eu cheguei a esta conclusão, eu disse puxa vida, mas como eu tenho mentido Eu pus a mão na cabeça e disse um dia, terminei esta fase e daqui para diante eu vou tentar fazer só arquitetura verdadeira, arquitetura autêntica, porque esta é a primeira qualidade necessária na arquitetura, autenticidade. E eu resolvi fazer arquitetura autêntica. com muita dificuldade no princípio, porque a minha mão já ia lá para aquelas curvinhas, aqueles telhadinhos de telha de de fa diversos tipos e aquelas soluções que eu já estava acostumado a fazer. Mas eu tomei uma decisão e muita ma dificuldade também porque todos os meus clientes, que não eram poucos, me pediam casas em estilo. E o sujeito chegava no meu escritório e me dizia, o senhor me faz uma casa Uma casa grande, eu tenho um terreno de vinte e cinco por quarenta Eu quero uma casa colonial mexicano. E eu dizia logo de cara, não faço. Mas você fez para o meu irmão. Mas não faço mais. Mas por que faz para ele e não faz para mim? Porque quando eu fiz para ele, eu estava enganado. E eu percebi o meu erro e não quero mais cair em outro erro. E eu acho que o errar é humano, mas insistir no erro é que é o pecado. Muita gente deixou de falar comigo porque eu deixava de fazer as casas nos seu nos estilos que queria. Eu rompi então de repente com o meu passado e estou tentando até hoje fazer um pouquinho de arquitetura contemporânea. Mas para ilustrar estes meus pecados, vocês não pensem que Esta coisa é só de falação, de que a coisa é verdadeira mesmo. Eu trouxe alguns slides da minha arquitetura antiga e trouxe esta revista com as minhas casas antigas e a coleção dos primeiros números da revista Acrópole Eu vou projetar, então, estas casas para depois, então, que vocês possam () Eu preferia ou colonial ou moderno. E essa luta durou algum tempo até que eu me decidi. Mas simplesmente, é como aquela história do sujeito que éh ia atirar na girafa, que estava bêbado e via duas girafas, né? Por azar dele, a atirou na o o leão já tirou no leão que não era e o leão que era comeu o () Eu, infelizmente, na hora de escolher, eu escolhi errado e voltei na no colonial e fiz uma casa colonial para mim mesmo. Esta é uma das casas que eu fiz para um irmão Isso nós chamamos de Tudor, por causa daquele arco, o arco com achatado, de () e tal. Esta era era mexicana, colonial mexicano. Está na Avenida Brasil, esquina de Rua Canavá. Essa casa tem até u u um poço, um poço com com uma gola para descer, éh a corda e a caçamba, tem tudo lá. Só que não tem água, não tem poço. (risos) É o jogo do faz de conta. (risos) Não pensem que era fácil fazer um telhado desse tipo. Esta é a casa do professor Teodoro Braga, que eu fotografei agora, e ela está muito modificada. Rasparam a decoração marajoara que estava ali entre entre os dois balcões. Mas os balcões têm grades de pérola com desenho marajoara feito pelo professor Teodoro Braga. Ao mesmo tempo tinha um aspecto colonial, um beiral colonial e as luminárias azuis que eram muito comuns nas cidades antigas nossas para iluminarem a a rua na nos momentos de de festa, especialmente nas nas festas religiosas. E entre os estilos que eu fazia, eu também fazia moderno. Então aí está uma casa do estilo entre aspas moderno. Eu já, eu já tinha ali janela de canto, que era uma novidade. moderno também, entre os estilos que eu fazia. Então, quando nós fazíamos um colonial qualquer, como um normando, com madeiramento aparente, a gente fazia aquilo, era um uma argamassa que tinha de saliente um pouquinho, e depois a gente pintava de cor de madeira. Às vezes, o telhado era de laje, mas tinha que ter uns cachorros. O cachorro é aquele aquele pedaço de pau que aparece embaixo do beiral. Então, depois do telhado feito, a gente colava por baixo os (risos) os cachorros que deviam ser o suporte do telhado. (tosse) E aí está a revista Construções Residenciais, mil novecentos e trinta e sete, ela não está pegando tudo. e Engenheiro, arquiteto. () mil novecentos e trinta e se Esta é a casa da Gospa Amplona que eu falei, que fio ficou exposta junto com aquela outra moderna e com a casa do professor Teodoro Bragas. Três, cada uma de estil de um estilo, expostas no mesmo tempo, no mesmo dia. Tudo isso aqui é (). Isso não é madeira, não. É reboco pintado. Na mesma época, n no mesmo ano em que eu publiquei esse livro, o prédio do Ministério de Educação e Saúde, que é o marc o marco principal da arquitetura contemporânea brasileira e um dos marcos principais da arquitetura moderna em todo o mundo, estava sendo iniciado. Então, eu não posso dizer outra coisa senão isso. Isto não é mais um depoimento. É uma confissão de culpa. E como o céu está cheio de pecadores arrependidos e con que fizeram sua confissão, eu espero que esta minha confissão perante vocês também me dê o meu perdão. Como é do costume, estou pronto para responder a perguntas que me façam. Quem vai apagar a luz?

SPEAKER 0: : ###

SPEAKER 1: : Mas a a minha missão é falar sobre a década de trinta. Eu já saí um pouquinho para justificar as minhas pautas. Mas... eu eu não tenho nada com o momento não. Quem sabe se na nas próximas aulas, nos próximos cursos, vou ter a oportunidade de mostrar alguma coisa.

SPEAKER 0: : () Bom, sempre nós contamos muito

SPEAKER 1: : com com revistas, especialmente revistas estrangeiras, com livros sobre arquitetura, e já existia, se eu era um eclético ainda, já existia aqui em São Paulo e no Rio de Janeiro. um grupo de arquitetos fazendo arquitetura contemporânea. Aqui em São Paulo, como eu disse, Bachavis, Flávio de Carvalho, Rino Levy, eh eram arquitetos que faziam arquitetura contemporânea. No Rio, anh o grupo da Escola de Belas Artes, que foi eh do tempo de Lúcio Costa, os irmãos Roberto, o Oscar Niemeyer, o Jorge Moreira, deveria es estar falando hoje aqui, mas não pôde vir. ãh Henrique Mindlin, que saiu daqui de São Paulo e foi fazer arquitetura moderna no Rio. E outros homens que que já faziam. Então, não faltava inspiração na em outras obras para que arquitetura contemporânea fosse feita. Só que eu não considero, para mim, eh como obras de valor essas tentativas que eu fiz neste período, como arquitetura contemporânea, porque eu eu era um eclético. Tanto eu fazia aquela arquitetura moderna, como eu fazia os outros estilos todos. Então ela não ela não tinha consistência. Ela não tinha lá dentro essa minha arquitetura. Era uma fachada que eu fazia eh e que podia ser de qualquer estilo (tosse) Eu só tomei consciência e só considero a arquitetura moderna minha depois que eu abandonei aquilo tudo e passei a fazer só moderno. Não por uma preferência de estilo, mas por uma convicção de que só aquilo é moderno.

SPEAKER 0: : Só aquilo é arquitetura. ()

SPEAKER 1: : Aquelas casa são Na dé na década de trinta. Elas são posteriores à década de vinte. Mas foram revolucionárias. () O Flávio sempre foi um homem desinibido. Nós vamos ouvi-lo aqui segunda-feira e vocês vão ver as coisas que ele é capaz de dizer. Ele já me di já me avisou. Eu não vou fazer fofoca. Tudo que eu vou dizer é verdade. Quem se sentir magoado, que se sinta. Mas eu não posso f falsear a coisa. E ele vai dizer mesmo. Lamentável. (risos) Isto é uma uma promoção comercial. Não tem nada de arquitetura. Indivíduos que resolvem fabricar móveis velhos. E tem gente habilíssima para fazer isso. Eles até chegam a enterrar madeira, para parecer bem velha. E depois precisam ter para quem vender. Então fazem a promoção desses estilos, única e exclusivamente para isso.

Inf :elizmente, como nós aceitamos as coisas com muita facilidade, a freguesia tá aí enchendo eles de de de dinheiro. Estão faturando que não é brinquedo () Eu tenho um amigo argentino, E uma ocasião esteve aqui no Brasil, foi a Ouro Preto, foi ah ah a Bahia, Salvador. E em Salvador ele comprou uma estatueta, uma imagem do século dezessete, autêntica. E custou um dinheirão. Mas era autêntica e era linda. E o rapaz comprou, mandou vir dinheiro de Buenos Aires, porque o dinheiro que ele tinha não chegava. E carregou aquela estatueta, aquela imagem. Eu digo estatueta porque depois eu vou mostrar que ela não era autêntica. E ele veio muito feliz com aquilo, certo de que tinha feito o melhor negócio do mundo, apesar de ter pago uma fortuna. Depois ele foi a Ouro Preto, andou comprando mais umas coisinhas e tal, e disseram a ele olha, tem um sujeito ali, numa biboca ali embaixo, que tem muita coisa também, o senhor vai lá fazer uma visita. E ele, pacientemente, desceu lá uns barrancos e entrou num barraco de um sujeito. Aí ele viu uma vitri, uma prateleira, tinha uns cinco metros de comprimento, Todinha cheia de esta de de imagens iguaizinhas àquela dele do século dezesseis Repetindo, eu era um fabricante de de imagens antigas. Tem freguês para isso que não acaba mais. Eu tenho uma imagem antiga. E tenho um prazer louco de olhar aquela imagem. Mas ela tem para mim uma qualidade que é essencial para que eu a admire. É autêntica. Ela num não faz de conta nela Ela é ela é mesmo. Ela não parece com nada eh Ela é el e me é ela mesma. E é assim que tem que ser tudo na s na nossa vida. Também a arquitetura, também os nossos quadros também  Você veja, você compra um anel de brilhantes desse tamanho, falso, e custa dois, três cruzeiros. E você compra um outro anel autêntico e custa milhões de cruzeiros. E um desapercebido olha assim de repente e não sabe qual é o verdadeiro e qual é o falso. Mas o entendido sabe. Aquele falso não vale nada. E o verdadeiro tem um valor i inestimável. Assim também é a arquitetura. Quando a gente vê uma casa muito bem desenhadinha, muito bem construída, falsa, arquitetonicamente não vale nada. Eu sei que isso choca um pouco a vocês, porque muitos de vocês moram em casas de estilo. Talvez até em casas que eu mesmo tenha feito.(risos) Mas esta é a hora da verdade, eu tenho que dizer tudo, né? Mais alguma pergunta? Então eu agradeço a presença de todos. ### E lembro que segunda-feira nós teremos, de manhã, Flávio Mota, o professor Flávio Mota, o grande professor Flávio Mota, para nos falar sobre arte no na década de trinta. E à tarde, às três horas, vamos ter Flávio de Carvalho, disposto a contar uma porção de coisas que nós não sabemos.